Os amigos do blog sabem que eu sou o autor do livro Teoria e Tradição da Guerra Justa: do Império Romano ao Estado Islâmico (editora Vide Editorial, 2016). No meu livro, eu explico, desde a Bíblia até os dias de hoje, como se pode defender a guerra sendo católico ou cristão, mostro quais são as condicionantes para se realizar um guerra justa, como foi elaborado desde Santo Agostinho.
No livro, em um rodapé, eu digo rapidamente quem foi Franz Jagerstatter, mártir que foi beatificado pela Igreja em 2007, na presença de sua esposa Franziska Jagerstatter, que morreu em 2013 aos 100 anos de idade.
Já falei aqui no blog sobre o filme "Uma Vida Oculta" que conta a história de Franz. Para se ter uma ideia, eu considero este filme o segundo melhor filme que vi em toda a minha vida. Só perde para Paixão de Cristo, de Mel Gibson. O filme é do diretor de cinema e filósofo Terence Malick. E é simplesmente espetacular. Vejam o trailer do filme clicando aqui, está atualmente disponível no NOW no Brasil.
Acabo de receber em casa o livro Franz Jagerstatter: Letters and Writings from Prison. (gostaria muito que o livro recebesse tradução para o português para que alcançasse os leitores brasileiros).
Em resumo, Jagerstatter foi uma austríaco, que morava em uma pequeníssima cidade na fronteira com a Alemanha, fazendeiro, casado e pai de três meninas, franciscano laico, que foi recrutado para o exército nazista, depois que a Alemanha de Hitler anexou a Áustria em 1938. Para participar do exército era preciso fazer juramento a Hitler. Jagerstatter alegou que isso era contra a fé dele, mesmo que o padre de sua paróquia e o bispo o aconselhasse a fazer o juramento. Ele foi até as últimas consequências negando fazer o juramento, mesmo que oferecessem a ele apenas o posto de enfermeiro no exército. Então, foi guilhotinado, aos 36 anos, em 9 de agosto de 1943, por conta disso.
Jagerstatter é assim um objetor de consciência da Segunda Guerra.
Não sei bem ao certo a profundidade da relação, mas me parece que movimentos pacifistas usam o nome de Jagerstatter. Não sei bem que tipo de movimentos pacifistas são esses. Será que usam Jagerstatter como ambientalistas usam São Francisco de Assis ou como comunistas usam Chesterton? Ainda terei que pesquisar mais.
Mas seria Franz Jagerstatter uma opositor da Teoria da Guerra Justa de Santo Agostinho?
Eu diria que não há nenhum motivo para isso.
Vejamos. Quais são as condições para a guerra justa?
Primeiro, se há uma guerra justa, há um país que segue a guerra justa e outro que não. Dever-se-ia avaliar as condições. Claramente, o mundo fez guerra justa contra Hitler, mas Hitler não fez guerra justa contra o mundo. Assim, logo de cara, exigia-se que Jagerstatter estivesse do lado errado.
Condições da Guerra Justa:
1) É preciso a presença de autoridade reconhecida para se declarar guerra.
Hitler foi eleito pelo povo da Alemanha (eu disse Alemanha e não Áustria), então ele tinha autoridade na Alemanha. A Áustria tinha eleito o grande líder católico Engelbert Dollfuss, que foi assassinado pelos nazistas (certamente, Jagerstatter foi influenciado por ele). Dollfuss era inimigo do nazismo com base na sua fé católica. É bom que se diga que a Alemanha, apesar de ser de maioria católica, é um país luterano na parte leste, e muito católica no sul do país, na fronteira com a Áustria. E a Áustria é um país católico. Na Alemanha da década de 30, como sempre ressalta o historiador Niall Ferguson, o maior opositor político de Hitler era o partido católico. Entre a população, Hitler tinha apoio maciço dos luteranos mas não dos católicos. Assim, a ação de Jagerstatter se insere neste contexto religioso.
Hitler não tinha autoridade sobre Jagerstatter.
Não passou pelo primeiro crivo. Mas vamos para outras condições:
2) País foi ofendido (invadido ou roubado ou sofreu ataque). Não, a Alemanha não sofreu nenhum ataque que mereceu ela revidar. Pelo contrário, ela invadiu os países.
3) Motivo justo. Não, Hitler não tinha motivo justo para a guerra.
4) Proporcionalidade. Não, Hitler não tinha proporcionalidade em nada. Ele era pela guerra, guerra total. Guerra de aniquilação.
Assim, sou devoto de Jagestatter sem qualquer problema com a minha defesa da teoria da guerra justa.
Assistam ao belíssimo filme Uma Vida Oculta.
Beato Jagerstatter, rogai por nós. Estamos em guerra já, mundo se torna cada vez mais anticristão.
Desejo um dia visitar Sankt Radegund, a terra de Jagerstatter.
Caro Pedro Erik,
ResponderExcluirLembro quando ainda estava apenas sendo divulgado e já esperava esse filme. Eu desconhecia Franz Jagerstatter, mas conhecia bastante Terrence Malick por conta do hobby (cinema).
Sempre gostei muito do filme "A Árvore da Vida", um filme exigente por conta dos vários símbolos que Malick "esconde", assim como o Além da Linha Vermelha pela temática Guerra que sempre me chamou atenção.
Malick não é um diretor simples, que deixa as histórias prontas, usando de personagens para explicar o que está acontecendo em cena. E por isso minha admiração. Admiração essa que veio antes da minha conversão.
Então quando juntou um diretor que eu admirava com um tema como o "Uma Vida Oculta" a questão ficou completa.
Ótima indicação, um bom filme para rever. E mais do que isso, se aprofundar no significado de fé.
Nesse último final de semana, por ocasião da celebração do Martírio de São João Batista li um pequeno sermão de Santo Agostinho que fala sobre o Martírio. Tomarei a liberdade de postar em seguida para apreciação.
Um forte abraço.
Ninguém morre por uma verdade da qual não está seguro
ResponderExcluirOs bem-aventurados apóstolos foram os primeiros a ver Cristo suspenso na cruz; choraram a sua morte, ficaram atemorizados face ao prodígio da sua ressurreição mas, logo a seguir, transportados de amor por esta manifestação do seu poder, não hesitaram em derramar o seu sangue para atestar a verdade do que tinham visto.
Pensai, irmãos no que era pedido a esses homens: ir por todo o mundo pregar que um morto tinha ressuscitado e subido ao céu; e sofrer, devido à pregação dessa verdade, tudo o que aprouvesse a um mundo insensato: privações, exílio, cadeias, tormentos, carrascos, feras ferozes, a cruz e morte. Teriam sofrido tudo isso por um desconhecido?
Teria Pedro morrido para sua própria glória? Teria pregado em proveito próprio? Ele morria e Outro, que não ele, era glorificado por essa morte; ele foi morto e Outro foi adorado. Só a chama ardente da caridade, unida à convicção da verdade, pode explicar semelhante audácia! Eles pregavam o que tinham visto.
Ninguém morre por uma verdade da qual não está seguro. Ou deveriam eles negar o que tinham visto? Mas não negaram, antes pregaram esse Morto que sabiam estar perfeitamente vivo. Eles sabiam por que vida desprezavam a vida presente, sabiam por que felicidade suportavam provas passageiras, por que recompensa espezinhavam todos esses sofrimentos. A sua fé pesava mais na balança que o mundo inteiro.
Santo Agostinho in Sermão 311, 2
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ResponderExcluirSe não pode haver uma guerra justa, então como a Igreja canonizou Santa Joana d´Arc que morreu por afirmar que fora enviada por Deus para fazer guerra contra os ingleses?
A própria santa reconhece que persistir em dizer que Deus a enviara significava ter a sua salvação. foi isto que ela disse aos seus juízes:" Seu dissesse que deus não me enviou eu me condenaria..." Ser contra a guerra defensiva contra uma injusta agressão é entrar em contradição com a doutrina da Igreja anterior e também seria então necessário descanonizar Joana d´Arc guerreira por vontade de deus e não como os outros santos guerreiros que foram santos por uma vida de de piedade e não por obedecer a Deus combatendo em nome dele.
Onde consigo comprar o seu livro sobre Guerra justa?