terça-feira, 4 de setembro de 2012

Não Compare Brasil com China. É um Insulto...para os chineses

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Ontem, eu li um texto muito interessante publicado no Valor Econômico. O texto é de um chinês explicando  a diferença entre os que os empresários ocidentais pensam do governo chinês e o que o próprio povo chinês pensa. O texto é de Minxin Pei, e é basntante profundo, podendo alimentar discussões sobre: i) democracia e ditadura; ii) egoísmo empresarial (eles não ligam para o sofrimento do povo chinês); ou iii) sobre a percepção do povo chinês sobre si mesmo.

Sobre este último ponto, o autor diz que os chineses não aceitram comparação com brasileiros ou indianos, eles não se consideram um país emergente, para eles a China é uma potência que renasce, é reemergente. Bom, a história da China é bem mais rica que a história do Brasil, afinal a China têm 5 mil anos de história. Quanto a Índia, a comparação é mais complexa, pois o comércio com a Índia é tão ou mais antigo que o comércio com os chineses, apesar da Índia só muito mais recentemente ter tido um poder central. Por outro lado, pode-se dizer que a China nunca dominou o mundo seja militarmente ou economicamente, nunca foi a potência que é hoje. Então, o pensamento do povo chinês deve ter esta ressalva.

Aqui vai o texto de Mixin Pei do Valor Econômico de ontem. É realmente muito bom.



China, aos olhos de quem a vê
Por Minxin Pei

Uma das mais flagrantes, ainda que despercebidas, coisas estranhas sobre a China, hoje, é como as percepções sobre seus líderes divergem conforme o observador. Aos olhos da opinião pública chinesa, os funcionários governamentais são venais, incompetentes e interessados apenas em obter nomeações lucrativas. Mas os executivos ocidentais invariavelmente descrevem as autoridades chinesas como inteligentes, decisivas, experientes e perspicazes - mais ou menos os mesmos adjetivos antes usados para descrever Bo Xilai, chefe do Partido Comunista Chongqing que caiu em desgraça, antes de ele ter sido expurgado).
É impossível conciliar esses pontos de vista. De duas, uma: ou é impossível agradar o público chinês ou os executivos ocidentais estão irremediavelmente errados. Mas, tendo em vista que a experiência diária situa os cidadãos chineses em posição infinitamente melhor do que os executivos ocidentais para avaliar as autoridades chinesas e sua conduta, teríamos de concluir que os primeiros estão, muito provavelmente, certos. E isso significa que os ocidentais que passaram um tempo considerável na China e consideram-se experientes "veteranos em China" precisam questionar-se sobre por que estão tão errados.
Uma explicação óbvia é que os funcionários governamentais chineses são extremamente bons em seduzir empresários ocidentais com gestos amistosos e promessas generosas. Os mesmos funcionários que ditam as regras para o cidadão chinês comum frequentemente projetam um charme irresistível para atrair investidores ocidentais.
Empresários ocidentais comparam a China com outros países em desenvolvimento, enquanto os cidadãos chineses não se vêem nesse grupo: eles consideram a China uma potência reemergente a caminho de fazer parte do grupo de países mais avançados
Outro ponto de atração, para os executivos ocidentais, é que muitos funcionários chineses têm formação em engenharia, em contraste com os seus homólogos ocidentais, em sua maioria advogados. Para os empresários, os engenheiros são solucionadores de problemas práticos, ao passo que advogados revelam-se obcecados por complexidade procedural e tendem a explorar brechas contratuais. Além disso, a maioria dos funcionários governamentais chineses aprenderam o jargão empresarial ocidental e são capazes de falar inteligentemente sobre os problemas que as empresas precisam resolver.
Uma razão mais sutil capaz de explicar a percepção dos executivos ocidentais é o referencial subconsciente que usam para a avaliar as autoridades chinesas. Altos executivos de empresas multinacionais tendem a ter noções preconcebidas sobre a China, assumida como apenas mais um país em desenvolvimento, e por isso avaliam as autoridades chinesas comparando-as com as de outros países em desenvolvimento.
Essa comparação inconsciente geralmente resulta favorável às autoridades chinesas, que são, em seu conjunto, melhor instruídas, mais cosmopolitas e mais focadas em negócios (porque o Partido Comunista usa o crescimento econômico e o investimento estrangeiro como critério para promover funcionários). E, como organização, o Estado chinês é muito mais forte e mais focado em objetivos do que os Estados em países em desenvolvimento mais típicos.
Mas, embora possa ser natural, para os empresários ocidentais, comparar a China a outros países em desenvolvimento, os cidadãos chineses têm padrões bem mais elevados, por que não se consideram apenas mais um país em desenvolvimento. Eles vêem a China como especial, uma potência reemergentes a caminho de passar a fazer parte do grupo de países mais avançados do mundo, e as práticas de governança que seus jornais citam como modelos são, invariavelmente, os de sociedades ricas, e não de países em desenvolvimento. Na verdade, uma maneira de insultar os chineses é dizer-lhes que deveriam sentir-se afortunados por que têm um governo melhor do que os indianos ou os brasileiros.
A terceira razão pela qual os empresários ocidentais têm uma impressão errada sobre a China é que sua admiração pelo governo chinês é reflexo de suas frustrações com seus próprios governos. Eles mostram-se impacientes em face da desordem do processo democrático, de regulamentações sufocantes, de impostos elevados e da fiscalização da mídia. Em contraste, no Estado chinês de partido único, os empresários verificam ser mais fácil fazer negócios com funcionários que podem tomar decisões rápidas e implementá-las quase instantaneamente.
Claro, às vezes esses executivos ignoram concretamente o Estado de direito que prevalece no Ocidente. Mas, em comparação com empresários privados chineses, os representantes de grandes empresas ocidentais são um grupo privilegiado, e não são tão frequentemente vitimados pela corrupção oficial. Como resultado, eles têm escassa percepção do pior aspecto do regime de partido único: uma elite voraz sem freios legais.
O aspecto mais lamentável das concepções equivocadas dos executivos ocidentais sobre o governo chinês é que elas tenderão a persistir, ao menos entre aqueles que não têm experiência direta com o lado sombrio do Estado chinês. Os executivos ocidentais são bem sucedidos, inteligentes e têm elevado grau de confiança em seu discernimento político. Além disso, as companhias ocidentais são hierárquicas e autocráticas, semelhantes, nesse aspecto, ao Estado de partido único chinês, de modo que erros de executivos de avaliação de altos executivos são raramente contestados por seus subordinados.
Isso é uma pena. Poucos executivos ocidentais compreendem as consequências políticas de seus equívocos. Seu louvor à qualidade e eficácia de autoridades chinesas é frequentemente percebida pelo Partido Comunista como um endosso internacional a suas políticas e sua legitimidade - apesar de os cidadãos chineses comuns saberem que a realidade é outra. (Tradução de Sergio Blum)
Minxin Pei é professor de Governo na Faculdade Claremont McKenna e pesquisador não residente sênior no German Marshall Fund dos EUA.

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