quarta-feira, 19 de setembro de 2012

Jesus foi Casado? Evidências Históricas.

-

A esta altura, vocês já devem saber que uma historiadora de Harvard, Karen King, está divulgando um pedaço bem pequeno de papiro do século IV, no qual se lê: "Jesus disse a eles, minha esposa...". A historiadora nega que isto prove que Jesus foi casado, apenas prova que havia uma debate sobre isso no começo do cristianismo. Mas não importa boa parte da imprensa escreve como uma prova.

Bom, sobre o assunto, eu não tenho muito a acrescentar sobre o que disse o blog Aggie Catholics. Inclusive, o texto deste blog é muito bom pois indica bons textos sobre o assunto. Aggie Catholic lembrou que:

1) A historiadora Karen King é especialista em textos gnósticos do cristianismo e não sobre a evidência histórica de Jesus;

2) Textos gnósticos são evangelhos apócrifos que atingiram seu apogeu nos séculos 2 e 3, de grupos de heréticos que eram mais místicos, contrário a dogmas, com tendência para a espiritualidade e para criar um Jesus que seria um sábio e não um salvador.  Eles escreviam diversas teorias sobre a vida de Jesus, tentavam reescrever a história de Jesus. Isto me lembra o espiritismo praticado no Brasil, em cada livro espírita há uma nova teoria sobre o paraíso e sobre Jesus (já vi até palestras espíritas sobre seres de outros planetas). Sobre a heresia do gnosticismo, o blog Aggie Catholic recomendou o seguinte texto do historiador da Universidade de Pensilvânia Phillip Jenkins: cliquem aqui.

3) O blog Aggie Catholics também sugere um texto de Carl Olson, que explica porque os evangelhos apócrifos são muito provavelmente falsos: eles mostram um Jesus fora do seu tempo, fora da vida real da época, não apresentam provas históricas, Jesus é como se fosse um espírito.

4) Sobre o possível casamento de Jesus, o blog Aggie Catholics nos leva ao texto do reverendo Dr. Mark Roberts, que discute as fontes históricas para saber se Jesus foi ou não casado. Vou resumir o texto do Dr. Mark Roberts. Ele diz:

         a) O Novo Testamento é completamente silencioso sobre se Jesus foi ou não foi casado;

         b) Mas o Novo Testamento fala da família de Jesus: mãe, pai, parentes, mas nunca de esposa;

         c) O Novo Evangelho fala de seguidoras de Cristo (Maria Madalena, Joana, Susana), mas não de mulheres de Cristo;
       
         d) Fora do Novo Testamento, dois estudiosos judeus do primeiro século, Filon e Josefus, mencionam que alguns judeus no tempo de Jesus eram solteiros por escolha. Filon foi contemporâneo de Jesus e era um filósofo que viveu em Alexandria, Egito. Josefus era um historiador judeu que viveu perto do fim do primeiro século. Eles mencionaram que um grupo de Essênios, judeus apocalípticos, não se casaram por escolha. E estes autores elogiaram a escolha de não casar dos Essênios o que sinaliza que poderia haver aprovação social para não se casar;

        e) Sobre Maria Madalena, a suposta esposa de Cristo, Roberts nos diz que há vária Marias no Novo Testamento, incluindo a Virgem Maria e Maria de Betânia (Lucas 10:38-42), além de Maria Madalena (ou Maria da vila de Magadala);

        f) Maria Madalena, no Novo Testamento, é uma das mulheres que acompanharam Jesus em sua missão de pregar e ajudaram Cristo com bens que tinham conseguido. O evangelho de Lucas adiciona que sete demônios foram expulsos de Maria madalena por Jesus (Lucas 8:2). Mas nada sugere que havia um relacionamento especial entre Jesus e Maria Madalena. Jesus era diferente apenas por ter mulheres sendo ensinadas também por ele, os judeus não constumavam ensinar para mulheres.

       g) Maria Madalena foi uma das mulheres que assistiram à crucificação de Cristo. Então, na manhã de Páscoa, ela e duas outras mulheres foram a tumba de Cristo e a encontram vazia. Maria Madalena de acordo com João 20 encontra Jesus próximo da tumba e corre para anunciar sua ressurreição. Em certo sentido, ela é a primeira cristã a anunciar a boa nova da Páscoa. É isto que o quadro acima de Alexander Ivanov mostra. Maria Madalena vendo Cristo ressucitado.

      h) Maria Madalena foi associada a prostituta que lava os pés de Cristo, mas não há nada no evangelho que diga que se trate de Maria Madalena (Lucas 7:36-39). Não há razão para se pensar que Maria Madalena era a prostituta.

      i) Nada há além disso, não há nada no Novo Testamento que sugira que Jesus foi casado com qualquer mulher.

E nos evangelhos apócrifos? Há algo que sugira que Maria Madalena era esposa de Cristo? Vamos mostrar agora o que há nos evangelhos apócrifos (gnósticos).

     h) Considerando o evangelho gnóstico possivelmente mais antigo, Evangelho de Tomé, Maria Madalena aparece apenas em duas passagens, na primeira ela faz uma pergunta para Jesus: "Com quem se parecem seus discípulos?" Na segunda, Simão Pedro diz: 

"Que Maria saia de nós, pois as mulheres não são dignas da vida." Jesus responde: "Eu mesmo vou guiá-la para torná-la macho, para que ela também possa tornar-se um espírito vivo semelhante a vós, machos. Para cada mulher que vai fazer-se homem entrará no Reino dos Céus."

Vejam que no evangelho gnóstico mais antigo, Jesus não é muito amigável com as mulheres, e deseja que Maria Madalena se torne homem(!) Não parece o Jesus amável dos evangelhos aceitos pela Igreja.

       i) O evangelho apócrifo de Pedro, escrito no segundo século, foca apenas nas últimas horas da vida de Jesus. Neste evangelho, Jesus não sentiu nenhuma dor ao ser crucificado (!). Jesus é assim afastado de sua humanidade. Maria Madalena aparece apenas na festa da Páscoa quando ela e outras mulheres vão para tumba de Cristo chorar a morte Dele.  Ela é descrita como uma discípula feminina. Não há nenhuma palavra neste evangelho gnóstico que diz que Maria Madalena se casou com Cristo.

       j) O Diálogo do Salvador também foi escrito no segundo século, é um diálogo entre o Salvador (que nunca é nomeado como Jesus Cristo) e alguns discípulos, incluindo Maria Madalena. Os discípulos fazem questões esotéricas e o Salvador responde também de forma esotérica. O Diálogo mostra Maria Madalena fazendo perguntas e diz que ela conhecia a realidade espiritual. Também não há nada sobre casamento. De novo, ela é apenas uma das seguidoras ou discípulas de Cristo.

       k) A Sabedoria de Jesus Cristo é um diálogo entre o Cristo ressucitado e alguns de seus seguidores, incluindo Maria Madalena, também é do século 2. Maria Madalena também faz perguntas e também não há nada sobre casamento.

        l) O Pistis Sophia (Sabedoria da Fé) é um evangelho gnóstico escrito no século 3, e no qual Maria Madalena tem um importante papel, fazendo a grande maioria das perguntas sobre questões esotéricas. Jesus diz que ela é abençoada entre as mulheres, porque ela tem o pleno conhecimento e a vida espiritual dentro dela. Jesus promete não esconder nada dela. O Pistis Sophia é um importante  evangelho pars os cristãos gnósticos, que valorizam o conhecimento em assuntos esotéricos.  

      m) No Evangelho de Maria, escrito no século 2, se vai ainda mais longe, Maria Madalena é a fonte de segredos porque ela tem uma relação muito próxima com o Salvador (também neste evangelho não há o nome Jesus). Em uma passagem, Pedro pergunta: "Irmã, nós sabemos que o Salvador ama você, mais do que as outras mulheres. Diga-nos as palavras do Salvador que você lembra". Então Maria Madalena revela o Senhor em sua visão no qual o contéudo é incompreensível, esotérico demais. No mesmo Evangelho de Maria, alguns discípulos não parecem tão impressionados com ela. André diz que não acredita nas palavras dela, pois são idéias estranhas. Apesar da posição especial de Maria Madalena no evangelho, como recebedora especial dos ensinamentos de Cristo, não há nada que sugira que ela foi esposa de Cristo.

     n) O Evangelho de Filipe, o último dos evangelhos extra-bíblicos que mencionam Maria Madalena,  é o que mais excita os defensores de seu casamento com Jesus. O Evangelho de Filipe foi escrito no século 3, é o mais novo dos evangelhos gnósticos.  Não é um evangelho no sentido comum, mas sim uma coleção de observações teológicas escritas a partir do ponto de vista gnóstico. Algumas, mas nem todas observações, mencionam Jesus. Duas passagens referem-se a Maria Madalena, que desempenha um papel pequeno no evangelho.

     o) A primeira dessas passagens lê: "Havia três que sempre andavam com o Senhor: Maria, sua mãe, sua irmã e Madalena, o que foi chamada sua companheira". Muito tem sido insinuado sobre a palavra companheira, que, no original grego é koinonos. Mas, ao contrário da ilusão de alguns, essa palavra não significa cônjuge ou consorte sexual. Significa "parceiro", e é usado várias vezes no Novo Testamento com este sentido comum (por exemplo, quando Paulo se refere a si mesmo como koinonos de Filemom (Filemon 1:17).


    p) A segunda passagem no Evangelho de Filipe, que cita Maria Madalena, é a mais sugestiva: "E a companheira do Salvador é Maria Madalena. Mas Cristo a amava mais do que todos os discípulos e costumava beijá-la muitas vezes na boca. O resto dos discípulos se sentiram ofendidos por ela e expressavam desaprovação. Eles disseram-lhe: "Por que você a ama mais do que todos nós?" O Salvador respondeu, e disse-lhes: "Por que eu não te amo como ela?" Quando um homem cego e aquele que vê estão os dois juntos na escuridão, eles não são diferentes um do outro. Quando a luz chega, então, aquele que vê verá a luz, e aquele que é cego permanecerá na escuridão ".


    q) Mesmo supondo-se que esta passagem, que não aparece em nenhum outro documento, e que foi escrita dois séculos depois dos Evangelhos bíblicos, transmita informações historicamente precisas, a passagem em si parece refutar casamento de Jesus com Maria. Com certeza, se Jesus tivesse sido casado com Maria seu carinho especial por ela não teria sido uma ofensa. E, certamente, Jesus poderia ter satisfeito a pergunta dos discípulos, explicando que Maria era sua esposa. Mas ele não faz isso. Em vez disso, ele explica sua afeição especial para Maria, apontando para a sua capacidade de ver a luz, isto é, ter conhecimento. Nada nesta passagem sugere que Jesus e Maria eram casados. Além disso, dado que é dito em outro lugar no O Evangelho de Filipe sobre o beijo (seções 58-59), é possível que esta passagem não deva ser tomada literalmente. O texto pode muito bem usar a metáfora de beijar a dizer que Jesus revelou a verdade para Maria. Se isso for verdade, o Evangelho de Filipe é consistente com o que temos visto em outras partes dos evangelhos gnósticos.


    r) É isso aí. Essa é a melhor evidência não-canônica para o casamento de Jesus e Maria: uma passagem que, mesmo se tomadas pelo valor de face parece contradizer o casamento hipotético.  Os textos simplesmente não apoiam a teoria de que Jesus e Maria Madalena eram casados.



E o que eu tenho a acrescentar às informações mencionadas acima? Não muito, apenas digo que Cristo ressaltou o celibato na passagem Mateus 19:12, para que os homens se dedicassem plenamente ao Reino de Deus e que as mulheres têm papel especial na Igreja, inclusive muitas são doutoras da Igreja, como Santa Teresa de Ávila, Santa Catarina de Siena,  Santa Teresinha de Lisieux e Santa Hildergard de Bingen.


3 comentários:

Anônimo disse...

This was precisely the answers I'd been searching for. Amazing blog. Incredibly inspirational! Your posts are so helpful and detailed. The links you feature are also very useful too. Thanks a lot :)

Eduardo Araújo disse...

Ótima análise, Pedro!

Além disso, atente para o seguinte:

1 - existe um propósito em autores da moda (tipo Dan Brown) - não incluindo, necessariamente, a dra. Karen - de desconstruir a religião cristã, a partir do esvaziamento de suas crenças fundamentais (divindade de Jesus, ressurreição);

2 - a tática é reduzir Jesus a uma figura histórica meramente humana, sem qualquer alcance sobrenatural, mediante a insinuação de uma vida erótica do Cristo. A partir daí, conseguiriam duas coisas de uma tacada: destruir o Cristianismo, que odeiam; e promover suas "religiões" naturalistas, impregnadas de relativismo e hedonismo;

3 - interessante, também, que os que propagam ad nauseam esse tipo de "descoberta", como se fosse a última palavra sobre Jesus, concedem crédito irrestrito (e acrítico) a essas fontes altamente questionáveis ao mesmo tempo em que são céticos ferrenhos em relação aos evangelhos canônicos, numa típica atitude hipócrita.

Pedro Erik Carneiro disse...

Muito obrigado, Eduardo.

Concordo plenamente com seu comentário, amigo. Nada a acrescentar ao que você disse.

Abraço,
Pedro Eerik