sábado, 30 de setembro de 2023

Suécia: Importe Terceiro Mundo Viva como Terceiro Mundo

 


Ano passado a Suécia teve 60 assassinatos  por armas de fogo, maior número da história do país. O Brasil costuma ter mais de 40 mil mortes violentas por ano. Mortes violentas é uma medição diferente de mortes por armas de fogo. A população da Suécia é menor do que a população da cidade de São Paulo, não passa de 11 milhões. Enquanto o Brasil tem 220 milhões de habitantes. Se a Suécia fosse tão ruim em termos de mortes violentas como é o Brasil, teria em termos relativos, 2 mil mortes por ano. 

O Brasil é um dos países com mais mortes violentas no mundo, taxa de por volta 25 para cada cem mil habitantes, assim como muitos países latino-americanos, como El Salvador, Honduras, Venezuela, México, Jamaica e países africanos como Lesoto, Nigéria e África do Sul. Na Suécia, a taxa costuma ficar por volta de 1,1 por cem mil habitantes, mais de vinte vezes menor do que no Brasil.

Mas qual é causa desse aumento no número de mortes violentas na Suécia? Mesmo jornais esquerdistas reconhecem: gangues de imigrantes por controle de drogas.

Já ouviram falar do tráfico de drogas usarem menores para cometer crimes no Brasil? Sim, isso é corriqueiro no Brasil. Mas agora isso ocorre também na Suécia, e eles estão surpresos.

A Suécia está agora chamando o exército para controlar a situação dos crimes violentos.

A imigração deve ser feita com muito cuidado para não prejudicar a unidade social de um país. Eu já morei em dois países, sempre procurei entender que eu estava como assim dizer morando na casa dos outros, então, não mexo nas coisas.

Traduzi abaixo a notícia sobre o assunto do Zero Hedge:

Suécia recorre aos militares em busca de ajuda em meio a tiroteios diários e atentados no caos de gangues de migrantes

No ano passado, a Suécia testemunhou o maior número de mortos em tiroteios da história, com mais de 60 mortos, e este ano está no caminho para ultrapassar esse número, à medida que a violência dos gangues no país continua a sair de controlo.

Neste momento, as cenas de migrantes ilegais que inundam o sul da Europa vindos do Mediterrâneo continuam inabaláveis, e mesmo as principais publicações como o Financial Times não hesitaram em identificar o que está a alimentar o crime e a transformar as ruas da Suécia em zonas de guerra: "Os chefes da polícia disseram que a Suécia está a enfrentar a situação de segurança interna mais grave desde a Segunda Guerra Mundial, à medida que gangues de traficantes de imigrantes se envolvem num conflito sangrento", escreve o FT.

E há até “crianças-soldados” no coração da Europa Escandinava: “A polícia acredita que as gangues utilizam cada vez mais crianças para cometer crimes, já que os menores de 18 anos muitas vezes ficam impunes ou recebem penas baixas dos tribunais”.

Manchetes como esta, publicadas há alguns dias pela Associated Press, tornaram-se tragicamente quase comuns: um menino de 13 anos encontrado baleado na floresta foi vítima da violência de gangues na Suécia. As gangues também cometem regularmente bombardeios e incêndios criminosos, às vezes destruindo quarteirões e distritos inteiros da cidade.

A Suécia tem sido durante grande parte da última década o principal bastião das políticas liberais de imigração na Europa, tendo acolhido centenas de milhares de migrantes e requerentes de asilo do Médio Oriente e de África. Simultaneamente, a sua terceira maior cidade, Malmö, tem sido durante anos amplamente vista como a capital europeia dos homicídios armados.

E, no entanto, a Esquerda Europeia tende apenas a enfatizar pontos de discussão sobre "fracasso na integração", "racismo" e "extremismo de direita" - o que levou a "sociedades paralelas", servindo para desencadear periodicamente motins em locais com grandes concentrações de imigrantes.

Agora, depois de mais uma dúzia de vidas terem sido perdidas este mês, o que incluiu tanto transeuntes inocentes como jovens membros de gangues, os líderes governamentais estão a falar em “endurecer” convocando os militares:

O primeiro-ministro da Suécia disse na quinta-feira que convocou o chefe das forças armadas para discutir como as forças armadas podem ajudar a polícia a lidar com uma onda de crimes sem precedentes que chocou o país com tiroteios e bombardeios quase diários.

O primeiro-ministro Ulf Kristersson reunir-se-á com o comandante supremo das forças armadas e com o comissário nacional da polícia na sexta-feira para considerar "como as forças armadas podem ajudar a polícia no seu trabalho contra os grupos criminosos".

“A Suécia nunca viu nada assim antes”, disse Kristersson sobre o aumento do crime violento durante um discurso televisionado na quinta-feira à nação. “Nenhum outro país da Europa está a ver algo assim.”

De acordo com mais informações da AP:

A Suécia tem lutado contra a violência de gangues há anos, mas o aumento de tiroteios e bombardeamentos em Setembro foi excepcional. Três pessoas foram mortas durante a noite em ataques separados com suspeitas de ligações a gangues criminosas, que muitas vezes recrutam adolescentes em bairros de imigrantes socialmente desfavorecidos para realizar ataques.

Uma das vítimas foi uma mulher de 20 anos que morreu numa explosão em Uppsala, ao norte de Estocolmo. A mídia sueca disse que ela provavelmente não era o alvo do ataque.

Abordando o trágico atentado desta semana, Kristersson descreveu que “Uma mulher de 25 anos foi para a cama ontem à noite, numa noite completamente normal, mas nunca conseguiu acordar”.

Ele acrescentou: “Vamos caçar as gangues, vamos derrotar as gangues”. A poderosa explosão acima mencionada numa área residencial destruiu as fachadas de várias casas.

O governo de centro-direita de Kristersson subiu ao poder no ano passado, em grande parte com base numa plataforma de endurecimento contra o crime

Kristersson fez algo raro por um político sueco, atribuindo a culpa diretamente às “políticas de migração irresponsáveis e à integração falhada” sob o governo anterior e a anos de políticas falhadas.



Jordan Peterson e Jim Caviezel sobre o Demônico.




Jordan Peterson e o autor Jim Caviezel conversam sobre como o mundo glorifica o demônio, como se o demônio fosse um rebelde contra os poderes, e como isso é perigoso para todos, e como os filmes ao glorificarem o demônio prejudicam tanto as pessoas, inclusive os atores e atrizes. O poder do demônio é atrativo e enganador, ao mesmo tempo. Como Chesterton costumava dizer: o demônio não lhe atrai vestido de vermelho com chifres ameaçadores, mas sim usando coisas que você pode se apegar. 

Encontrei um vídeo com a tradução para o português do vídeo (segundo vídeo).

Para ajudar entender, eles falam sobre Tim Ballard (policial que Jim Caviezel interpretou no filme Sound of Freedom), Alejandro Monteverdi (diretor do filme), Heath Ledger (que interpretou o coringa de forma muito demônica, e após o filme se suicidou).



sexta-feira, 29 de setembro de 2023

Francisco: A Igreja Sou Eu


Muito bem resumido o texto de Sandro Magister, pelo site The American Catholic, ao relacionar a frase de Luís XIV, que disse "O Estado Sou Eu"com o comportamento autocrático de Francisco, que parece dizer a todos: "A Igreja Sou Eu".

O caso em questão é que, assim como fez ao colocar a palavra "inadmissível" no Catecismo  para tratar sobre pena de morte, quando Francisco fez isso sem consultar a ninguém, nem mesmo o magistério dos  Doutores da Igreja (justificou apenas em si mesmo), Francisco decidiu que o sínodo envolve agora não apenas bispos, mas também leigos, uma mudança que ele fez sozinho e até contra a tradição da própria palavra tanto na Igreja Católica como nas Igrejas Cristãs Orientais.

Sandro Magister lembra uma afirmação do arcebispo argentino Victor Manuel Fernández que declarou, sem qualquer base apenas teológica, que Francisco tem "um carisma especial que ninguém tem", daí ele pode fazer o que quiser com a Igreja. Uma concepção sem qualquer fundamento e que amplia ao infinito a infalibilidade do papa, em contradição com o que a Doutrina da Igreja sobre os limites dos poderes de um papa.

Vou traduzir abaixo o texto de Sandro Magister:

Poder para o povo ou monarquia absoluta? As contradições de Francisco

Muita coisa está acontecendo que é contraditória na Igreja Católica. Por um lado, está a celebração de um sínodo sobre a sinodalidade, que alarga a participação na governação da Igreja muito além do papa e dos bispos, aos sacerdotes, religiosos e leigos, homens e mulheres. Mas, por outro lado, assiste-se a um exercício dos poderes papais, por parte de Francisco, mais autoritário e monocrata do que nunca.

Com uma inovação acrescida extemporânea, anunciada no dia 11 de setembro pelo novo prefeito do Dicastério para a Doutrina da Fé, o argentino Victor Manuel Fernández, que, respondendo por escrito às perguntas de Edward Pentin para o “Catholic Register”, atribuiu a Francisco “um carisma particular para esta salvaguarda, um carisma único, que o Senhor deu apenas a Pedro e aos seus sucessores”, mas do qual ninguém tinha ouvido falar até agora.

Trata-se de “um dom vivo e ativo”, explicou Fernández, “que atua na pessoa do Santo Padre. Eu não tenho este carisma, nem você, nem o Cardeal Burke. Hoje só o Papa Francisco o tem. Agora, se você me disser que alguns bispos têm um dom especial do Espírito Santo para julgar a doutrina do Santo Padre, entraremos num círculo vicioso (onde qualquer um pode afirmar ter a verdadeira doutrina) e isso seria heresia e cisma. Lembre-se de que os hereges sempre pensam que conhecem a verdadeira doutrina da Igreja. Infelizmente, hoje, não só alguns progressistas caem neste erro, mas também, paradoxalmente, alguns grupos tradicionalistas.”

É difícil pensar numa extensão mais ampla da infalibilidade do papa em questões de fé, afirmada pelo Concílio Vaticano I dentro de limites extremamente rigorosos. E, de facto, o novo dogma inesperadamente expresso por Fernández foi imediatamente alvo de uma enxurrada de críticas.

As mais aprofundadas e contundentes vieram do campo conservador, no blog “Caminante Wanderer”, de um estudioso argentino anônimo e erudito.

Mas também do lado oposto, o “carisma” progressista, muito singular, do qual, segundo Fernández, só Francisco é dotado, foi rejeitado sem apelo, precisamente por ser incompatível com os limites da infalibilidade papal reiterados pelo Concílio Vaticano II na dogmática constituição “Lumen gentium”. Massimo Faggioli, professor de teologia na Universidade Villanova, escreveu sobre isso em “Commonweal”.

Permanece ainda mais incompreensível, portanto, é a contradição entre os ilimitados poderes monocráticos dos quais Francisco se considera cada vez mais investido de cima, completos com a marca do seu teólogo da corte, e a “democratização” contemporânea da Igreja que ele busca com a nova sinodalidade.

Também nesta nova forma de Sínodo ocorreu uma mudança de rumo com Francisco, no decorrer do seu pontificado.

Voltando ao Concílio Vaticano II, na “Lumen gentium”, a constituição dogmática do Vaticano II expressamente dedicada à Igreja, a palavra “sínodo” ocorre apenas uma vez e é sinônimo da palavra “concílio”, que reúne exclusivamente o papa e os bispos.

Embora nos raros documentos pontifícios das décadas seguintes em que ocorre a palavra “sinodalidade”, ela se refere à forma como esta é praticada nas Igrejas Ortodoxas, ou seja, ao colégio de bispos reunidos com o seu patriarca ou arcebispo maior para exercer autoridade hierárquica sobre a respectiva Igreja.

Peter Anderson, um estudioso de Seattle que é um observador atento do que se passa nas Igrejas Orientais e envia a este respeito os relatórios factuais mais detalhados e bem documentados, constatou que desde o Concílio até ao final de 2013 houve apenas doze ocorrências da palavra “sinodalidade”: seis com João Paulo II, duas com Bento XVI e quatro com Francisco.

Disto se pode deduzir que, ainda durante o primeiro ano após a sua eleição como papa, Francisco não estava de forma alguma inclinado, pelo menos nas suas declarações públicas, a uma “democratização” dos sínodos.

A primeira vez que falou sobre “sinodalidade” foi em 28 de junho de 2013, dirigindo-se à delegação do Patriarcado Ecuménico de Constantinopla. E referia-se à “reflexão da Igreja Católica sobre a colegialidade episcopal”, pela qual era uma boa ideia “aprender” com a “tradição de sinodalidade tão típica das Igrejas Ortodoxas”.

A segunda vez foi na homilia do dia seguinte, festa dos santos Pedro e Paulo, para expressar a esperança de “harmonia” entre o sínodo dos bispos e o primado do papa.

A terceira vez foi na entrevista de setembro de 2013 com o diretor de “La Civiltà Cattolica”, Antonio Spadaro. Ali, pela primeira vez, ele lançou a ideia de que “talvez seja hora de mudar a metodologia do Sínodo, porque o atual me parece estático”. Mas repetir imediatamente que é “dos nossos irmãos ortodoxos” que “podemos aprender mais sobre o significado da colegialidade episcopal e da tradição da sinodalidade”.

A quarta vez foi na exortação apostólica “Evangelii gaudium” de 24 de novembro de 2013, documento que marcou a agenda do seu pontificado, onde, no entanto, novamente se limitou a dizer que “no diálogo com os nossos irmãos e irmãs ortodoxos, nós, católicos, temos o oportunidade de aprender mais sobre o significado da colegialidade episcopal e sua experiência de sinodalidade”.

Mas isso foi apenas o começo. Nos anos que se seguiram, para Francisco foi todo um crescendo de anúncios e decisões que levaram à atual mutação da forma do Sínodo, agora tão distante do modelo centenário ainda em uso nas Igrejas Orientais que ate fez com essas Igrejas Orientais protestassem.

Ao dar poder ao “povo de Deus”, isto é, ao estender a participação nos sínodos, com direito de voto, também aos batizados comuns, Francisco certamente realizou uma inovação abrangente.

Mas mais uma vez em completa contradição. Porque não foi um sínodo que decidiu a mudança, como diria o novo rumo “popular”, mas ele sozinho, o papa.

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terça-feira, 26 de setembro de 2023

Livro sobre Liturgia e Papa Herético.

 


Como a capa do livro diz, esses dois assuntos são do momento: liturgia e possibilidade de papa herético.  E vi ótima recomendação de nada mais nada menos que Peter Kwasnieswski. 

Estou atolado de livros para ler, mas certamente esse entrou na lista.



segunda-feira, 25 de setembro de 2023

Amantes de Cachorro (ou Gatos) e o Amor pelo Ser Humano


O cachorro de Dennis Prager, Otto, morreu, daí ele fez um excelente vídeo sobre amor a cachorros (ou gatos) e amor ao ser humano.

Prager diz que tem três preocupações com relação a pessoas que têm animais domésticos:

1) Pessoas que amam animais porque não amam humanos;

Ele perguntou por décadas aos estudantes dele: se o seu cachorro e um estranho estivessem se afogando, quem você salvaria? Apenas 33% disseram que salvariam o estranho, 33% assumiram que salvariam o cachorro e os outros 33% não quiseram opinar. 66% não disseram que salvariam o ser humano.

A principal razão para não salvar o estranho era que eles amavam o cachorro e não o estranho.

Prager que isso reflete o fato que vivemos na época dos sentimentos (feelings). Sentimentos hoje se tornaram os guias para o comportamento das pessoas. O que a pessoa sente é o que importa.

As pessoas estão abandonando a concepção judeu-cristã de que o ser humano é a imagem de Deus e assim um ser especial, além de todos os outros.


2) Muitas pessoas não querem ter filhos mas se referem aos seus animais como suas crianças.

Mas animais não são crianças.

3) Embora seja verdade que quem é cruel com animais muito provavelmente será cruel com pessoas, o inverso não é verdadeiro. Pessoas serem boas com animais não está relacionado a serem boas com pessoas.

Nenhum amor é comparável ao amor entre pessoas. Todos deveriam saber disso.

Dennis Prager diz que está procurando adotar outro bulldog, e este novo cachorro será amado. Mas a perda de uma pessoa não pode ser substituída como a perda de um cachorro. 

Cachorros aumentam o valor da vida em casa, a palavra hebraica para cachorro é Kelev ou Kalev (que pode ser traduzido como "como o coração"). Cachorros são preciosas companhias para os humanos, mas não devem diminuir o amor pelos humanos e sim aumentar.

Prager traz um pensamento final: 

Todos que adotam um cachorro sabem que verão ele morrer e sofrerão. Mas eles adotam mesmo assim. Tudo que realmente vale a pena fazer envolve sofrimento. Mas tem gente que não casa porque não quer se divorciar e assim perdem muito da felicidade da vida conjugal. Pessoas não querem ter filhos para não ter que sofrer para cuidar delas e assim perdem a maior experiência dessa vida: ser pai e mãe.   


domingo, 24 de setembro de 2023

Site Denuncia Fraudes Acadêmicas. 5.500 Denúncias só em 2022.



Fraude científica é coisa muita corriqueira, e fraudes que vão desde uso de plágio até manipulação de dados. Por vezes a fraude para mim é simplesmente por não entender os conceitos usados. E fraudar usando números ou estatística não é coisa muito difícil não, talvez até mais fácil por aparentar mais "cientifico e difícil". 

O site Data Colada reúne cientistas que ficam caçando as fraudes científicas. Muita gente séria foi denuncada e tiveram que deixar cargos e retirar artigos.

Como diz o texto publicado sobre o assunto no Wall Street Journal, fazer pesquisa séria é muito trabalhoso e leva muito tempo, um cientista sério faria poucas publicações na vida acadêmica.  Hoje em dia tem gente que não tem nem mestrado já possui mais de 100 publicações. 

A pressão por publicações para conseguir maior apoio financeiro na academia, muitos manipulam os dados, renegam as exigências de uma pesquisa séria, para que tenham resultados interessantes ou ideologicamente consistentes com a revista acadêmica em que procuram publicar.

Traduzo abaixo no texto do Wall Street Journal.

 O bando de desmistificadores destruindo maus cientistas

By Nidhi Subbaraman

O presidente de Stanford e um físico renomado estão entre os que foram derrubados por uma onda crescente de voluntários que expõem artigos de pesquisa defeituosos ou fraudulentos.

Um premiado professor e pesquisador da Harvard Business School passou anos explorando os motivos pelos quais as pessoas mentem e trapaceiam. Um trio de cientistas comportamentais que examinaram alguns de seus trabalhos acadêmicos concluiu que suas próprias descobertas foram extraídas de dados falsificados.

Foi uma ataque rotineiro dos três cientistas – Joe Simmons, Leif Nelson e Uri Simonsohn – que ganharam renome acadêmico por desmascarar estudos publicados baseados em dados defeituosos ou fraudulentos. Eles usam dicas, análise de números e instintos para descobrir o engano. Ao longo da última década, chegaram à sua própria conclusão: os números não mentem, mas as pessoas sim.

“Uma vez que você vê o padrão em muitos artigos diferentes, torna-se uma chance em quatrilhão de haver alguma explicação benigna”, disse Simmons, professor da Wharton School da Universidade da Pensilvânia e membro do trio que relata seu trabalho. em um blog chamado Data Colada.

Simmons e os seus dois colegas estão entre um número crescente de cientistas em diversas áreas em todo o mundo que trabalham como detetives de dados, examinando estudos publicados em revistas acadêmicas em busca de evidências de fraude.

Pelo menos 5.500 documentos defeituosos foram retirados em 2022, em comparação com 119 em 2002, de acordo com o Retraction Watch, um site que mantém um registro. O salto reflete em grande parte o trabalho investigativo dos cientistas do Data Colada e de muitos outros voluntários acadêmicos, disse o Dr. Ivan Oransky, cofundador do site. Suas descobertas levaram a retratações embaraçosas, carreiras derrubadas e ações judiciais retaliatórias.

O neurocientista Marc Tessier-Lavigne deixou o cargo de presidente da Universidade de Stanford no mês passado, após anos de críticas sobre os dados de seus estudos publicados. Postagens no PubPeer, um site onde cientistas dissecam estudos publicados, desencadearam o escrutínio do Stanford Daily. Seguiu-se uma investigação universitária e três estudos que ele co-escreveu foram retirados.

Stanford concluiu que, embora Tessier-Lavigne não se envolvesse pessoalmente em má conduta de pesquisa ou soubesse da má conduta de outros, ele “não conseguiu corrigir de forma decisiva e direta os erros no registro científico”. Tessier-Lavigne, que permanece no corpo docente, não quis comentar.

A busca por estudos enganosos é mais do que acadêmica. Pesquisas deficientes em ciências sociais podem levar a decisões corporativas erradas sobre o comportamento do consumidor ou a regras e políticas governamentais equivocadas. Pesquisas médicas errôneas podem causar danos aos pacientes. Pesquisadores de todas as áreas podem desperdiçar anos e milhões de dólares em doações tentando promover descobertas que se revelam fraudulentas.

Os detetives de dados esperam que o seu trabalho mantenha a ciência honesta, numa altura em que a fé do público na ciência está a diminuir. A pressão para publicar artigos – que podem render empregos, bolsas, palestras e assentos em conselhos consultivos corporativos – leva os investigadores a perseguir descobertas únicas e interessantes, por vezes à custa da verdade, de acordo com Simmons e outros.

“Fico louco com essa ciência lenta, boa e cuidadosa – se você fizer essas coisas, se fizer ciência dessa maneira, significa que publicará menos”, disse Simmons. “Obviamente, se você falsificar seus dados, poderá fazer qualquer coisa funcionar.”

A revista Nature alertou este mês os leitores para questões levantadas sobre um artigo sobre a descoberta de um supercondutor à temperatura ambiente – uma descoberta científica profunda e de longo alcance, se for verdade. Os físicos que examinaram o trabalho disseram que os dados não batiam. O físico da Universidade de Rochester, Ranga Dias, que liderou a pesquisa, não respondeu a um pedido de comentário, mas defendeu seu trabalho. Outro artigo que ele co-escreveu foi retirado em agosto, depois que uma investigação sugeriu que algumas medições haviam sido fabricadas ou falsificadas. Um artigo anterior de Dias foi retirado no ano passado. A universidade está analisando mais de perto seu trabalho.

Os especialistas que examinam dados suspeitos em estudos publicados consideram cada retratação ou correção de um artigo defeituoso como uma vitória para a integridade científica e a transparência. “Se você pensa em derrubar um muro, você vai tijolo por tijolo”, disse Ben Mol, médico e pesquisador da Universidade Monash, na Austrália. Ele investiga ensaios clínicos em obstetrícia e ginecologia. Seus alertas levaram os periódicos a retirarem cerca de 100 artigos, com investigações em andamento em cerca de 70 outros.

Entre aqueles que analisam o trabalho de outros cientistas estão Elisabeth Bik, uma ex-microbiologista especializada em detectar fotografias manipuladas em experimentos de biologia molecular, e Jennifer Byrne, pesquisadora de câncer na Universidade de Sydney que ajudou a desenvolver software para rastrear artigos em busca de sequências de DNA defeituosas que indicaria que os experimentos não poderiam ter funcionado.

“Se você tirar os detetives da equação”, disse Oransky, “é muito difícil ver como a maioria dessas retratações teria acontecido”.

Treinamento por acidente

As origens do Data Colada remontam à Universidade de Princeton em 1999. Simmons e Nelson, colegas estudantes de pós-graduação, tocavam em uma banda cover chamada Gibson 5000 e em um time de softball chamado Psychoplasmatics. Nelson e Simonsohn se conheceram em 2007, quando eram professores da escola de negócios da Universidade da Califórnia, em San Diego.

O trio tornou-se amigo e, em 2011, publicou seu primeiro artigo conjunto, “False-Positive Psychology". Incluía um experimento satírico que usava métodos de pesquisa aceitos para demonstrar que as pessoas que ouviam a música “When I’m Sixty-Four” dos Beatles ficavam mais jovens. Eles queriam mostrar como os padrões de pesquisa poderiam acomodar descobertas absurdas. “Eles são lendários por isso”, disse Yoel Inbar, psicólogo da Universidade de Toronto Scarborough. O estudo se tornou o artigo mais citado na revista Psychological Science.

Quando o trio lançou o Data Colada em 2013, ele se tornou um site para divulgar ideias sobre os benefícios e as armadilhas das ferramentas estatísticas e da análise de dados. “O objetivo era conseguir alguns leitores e não nos envergonharmos”, disse Simmons. Com o tempo, ele disse: “Nós acidentalmente nos treinamos para ver fraudes”.

Eles co-escreveram um artigo publicado em 2014 que cunhou o agora comum termo acadêmico “p-hacking”, que descreve a seleção seletiva de dados ou análises para fazer com que resultados insignificantes pareçam estatisticamente confiáveis. Os seus primeiros trabalhos contribuíram para uma mudança nos métodos de investigação, incluindo a prática de partilha de dados para que outros cientistas possam tentar replicar o trabalho publicado.

“Os três fizeram um trabalho fantástico no desenvolvimento de novas metodologias para questionar a credibilidade da investigação”, disse Brian Nosek, diretor executivo do Center for Open Science, uma organização sem fins lucrativos com sede em Charlottesville, Virgínia, que defende investigação fiável.

Nelson, que leciona na Haas School of Business da Universidade da Califórnia, em Berkeley, é descrito por seus sócios como o cara do panorama geral, capaz de se afastar do mato e ver uma perspectiva ampla.

Simonsohn é o gênio técnico, familiarizado com técnicas estatísticas opacas. “É nada menos que uma superpotência”, disse Nelson. Simonsohn foi o primeiro a aprender como identificar as impressões digitais de fraudes em conjuntos de dados.

Trabalhar em conjunto, disse Simonsohn, “é como ter um computador com três processadores principais trabalhando em paralelo”.

Os homens primeiro analisam os dados para ver se fazem sentido no contexto da pesquisa. O primeiro estudo que Simonsohn examinou em busca de dados incorretos no blog era óbvio. Foi pedido aos participantes que avaliassem uma experiência numa escala de zero a 10, mas o conjunto de dados inexplicavelmente apresentava números negativos.

Outra bandeira vermelha é uma afirmação improvável – digamos, um estudo que dizia que um corredor poderia correr 100 metros em meio segundo. Tais descobertas sempre recebem uma segunda olhada. “Você sabe imediatamente, de jeito nenhum”, disse Simonsohn, que leciona na Esade Business School em Barcelona, Espanha. Outro sinal revelador são os dados perfeitos em pequenos conjuntos de dados. Os dados do mundo real são caóticos e aleatórios.

Qualquer um deles pode desencadear um exame dos dados subjacentes de um artigo. “É apenas um erro inocente? É p-hacking?” Simmons disse. “Nunca nos apressamos em dizer fraude.”

Para acompanhar seu blog e outros empreendimentos, o trio envia mensagens de texto quase diariamente em um bate-papo em grupo, se reúne no Zoom uma vez por semana e envia e-mails constantemente.

O telefone de Simonsohn tocou em agosto, enquanto ele estava de férias com a família nas montanhas da Espanha. Simmons e Nelson deram a notícia de que estavam sendo processados por difamação em um processo de US$ 25 milhões.

“Fiquei completamente pasmo e apavorado”, disse Nelson.

‘Ela geralmente está certa’

Os dados incorrectos passam despercebidos nas revistas académicas, em grande parte porque as publicações dependem de especialistas voluntários para garantir a qualidade do trabalho publicado e não para detectar fraudes. Os periódicos não têm experiência ou pessoal para examinar os dados subjacentes em busca de erros ou manipulação deliberada, disse Holden Thorp, editor-chefe da família de periódicos Science.

Thorp disse que conversa com Bik e outros desmistificadores, observando que as universidades e outros editores de periódicos deveriam fazer o mesmo. “Ninguém gosta de ouvir falar dela”, disse ele. “Mas ela geralmente está certa.”

Os detetives de dados pressionaram os periódicos a prestarem mais atenção à correção dos registros, disse ele. A maioria contratou pessoas para revisar alegações de dados incorretos. A Springer Nature, que publica a Nature e cerca de 3.000 outras revistas, tem uma equipe de 20 pesquisadores, disse Chris Graf, diretor de integridade de pesquisa da empresa, o dobro de quando assumiu em 2021.

A Retraction Watch, que em conjunto com a organização de investigação Crossref mantém um registo de cerca de 50.000 artigos desacreditados ao longo do século passado, estimou que, em 2022, cerca de oito artigos foram retratados para cada 10.000 estudos publicados.

Bik e outros disseram que pode levar meses ou anos para que os periódicos resolvam reclamações sobre estudos suspeitos. Dos quase 800 artigos que Bik reportou a 40 revistas em 2014 e 2015 por veicularem imagens enganosas, apenas um terço foi corrigido ou retratado cinco anos depois, disse ela.

O trabalho não é isento de riscos. O especialista francês em doenças infecciosas Didier Raoult ameaçou processar Bik depois que ela denunciou supostos erros em dezenas de artigos que ele co-escreveu, incluindo um que apregoava os benefícios da hidroxicloroquina no tratamento da Covid-19. Raoult disse que manteve sua pesquisa.

Trabalho honesto

Simonsohn recebeu uma dica em 2021 sobre os dados usados em artigos publicados pela professora da Harvard Business School, Francesca Gino. Seus estudos conceituados exploraram questões morais: Por que algumas pessoas mentem? Que recompensa leva os outros a trapacear? Que fatores influenciam o comportamento moral?

Os três cientistas examinaram os dados subjacentes a quatro estudos e identificaram o que consideraram irregularidades na forma como algumas entradas apareciam. Os números nos conjuntos de dados parecem ter sido alterados manualmente. Em dezembro de 2021, enviaram as suas descobertas para Harvard, que conduziu a sua própria investigação.

Harvard concluiu que Gino era “responsável por ‘má conduta em pesquisa’”, de acordo com seu processo contra Harvard, Nelson, Simmons e Simonsohn. A Harvard Business School pediu aos periódicos que publicaram os quatro artigos que os retratassem, dizendo que seus resultados eram inválidos.

Em junho deste ano, o trio publicou suas conclusões sobre os estudos de Gino no Data Colada. Os dados de quatro jornais, disseram eles, foram falsificados. Quando restauraram o que supunham ser informação correta num dos quatro estudos, os resultados não apoiaram as conclusões do estudo. As postagens causaram alvoroço na comunidade das ciências sociais.

Gino está em licença administrativa e a escola iniciou o processo de revogação de seu mandato. Em seu processo, Gino disse que a investigação de Harvard era falha e tendenciosa contra ela por causa de seu gênero. Um porta-voz da escola de negócios não quis comentar. O processo também afirma que as postagens do blog Data Colada a acusaram falsamente de fraude. Os três cientistas disseram que mantiveram as descobertas publicadas.

Gino, por meio de seu advogado, negou qualquer irregularidade. Ela está pedindo pelo menos US$ 25 milhões por danos. “Discordamos veementemente de qualquer sugestão do uso da palavra fraude”, disse o advogado de Gino, Andrew Miltenberg. Gino não quis comentar.

Miltenberg disse que Gino estava trabalhando para refutar as conclusões de Data Colada.

Em agosto, um grupo de 13 cientistas organizou uma arrecadação de fundos que, em um mês, arrecadou mais de US$ 300 mil para ajudar a custear os custos legais da Data Colada.

“Essas pessoas estão enviando um sinal muito caro”, disse Simmons. “Eles estão pagando literalmente dólares para dizer, ‘Sim, a crítica científica é importante’”.


sexta-feira, 22 de setembro de 2023

Francisco e o Amigo Abusador de Freiras Marko Rupnik

 

Esse homem que cumprimenta o papa Francisco é o jesuíta Marko Rupnik, ele é acusado de muitos abusos sexuais de freiras por várias décadas. Abusos que envolvem estupro em troca de absolvição na confissão, e freiras bebendo o sêmen dele. Sim, terrível. Ele foi excomungado por um bereve período e depois retirado a excomunhão (dizem que a retirada da excomunhão teve forte apoio de Francisco). Agora muitas reportagens apontam que Francico deseja reabilitá-lo completamente. Rupnik é artista, pinta quadros, e Francisco gosta muito de expô-los. Muitos sites costumam mostrar que mesmo após a excomunhão, Francisco continuou expondo os quadros.

Sobre as tentativas de reabilitação de Rupnik, vejam em por exemplo a reportagem do Rorate Coeli, que diz que o mais audacioso movimento de Francisco é a reabilitação do absuador sexual Marko Rupnik.

Também tem o excelente artigo de Michael Brendan Dougherty no site National Catholic Reporter. Ele começa dizendo que o passatempo predileto de Francisco é reabilitar abusadores sexuais. Realmente há vários casos na Argentina, também nos Estados Unidos com o cardeal MacCarrick e agora com o ex excomungado esloveno Rupnik. Isso o que a gente toma conhecimento.

Vou traduzir parte dos dois artigos:

1) Rorate Coeli:

Então, neste verão, Francisco nomeou o Arcebispo Tucho Fernandez. Isto, apesar do papel de Fernández no encobrimento dos abusos sexuais na sua própria Diocese de La Plata e da sua autoria de um livro de poesia erótica dirigido a adolescentes

Há também o papel perturbador do próprio Francisco na cobertura pessoal do abusador sexual em série, Bispo Gustavo Zanchetta. Em 2022, Zanchetta foi condenado a quatro anos e meio de prisão por agredir sexualmente dois ex-seminaristas. Como observou o The Pillar, “apesar das crescentes reclamações dos padres locais [sobre a conduta perturbadora do Bispo Zanchetta para com os seminaristas], Francisco ficou do lado [do Bispo Zanchetta]. De acordo com o ex-vigário geral da diocese, mesmo depois de fotografias obscenas do bispo e de jovens foram descobertos no telefone de Zanchetta, o papa aceitou sua explicação de que ele havia sido hackeado por forças ‘conservadoras’ e ‘anti-Francisco’ na diocese”. Mesmo depois de aceitar a renúncia de Zanchetta, Francisco “criou para ele uma posição de sinecura na cúria e deu-lhe uma casa no hotel do Vaticano onde mora o próprio papa”

E talvez mais notoriamente, Francisco tentou reabilitar o predador Cardeal Theodore McCarrick, levantando as restrições às suas atividades e utilizando-o como conselheiro, antes que o abuso de McCarrick fosse publicamente exposto. McCarrick tem ligações estreitas com muitos bispos americanos próximos de Francisco. Houve inação semelhante por parte do Vaticano nos casos do abusador Dom Carlos Belo, do predador Dom Michel Santier e do padre abusador Pe. Carlos Buela, fundador do Instituto do Verbo Encarnado - que tinha ligações estreitas com McCarrick.

É claro, após dez anos, que o Papa Francisco optou por lidar com as alegações de abuso da mesma forma que lidou com quase todos os outros aspectos do seu pontificado: como uma forma de recompensar os seus amigos e punir os seus inimigos, nada mais.

O exemplo mais descarado está agora a desenrolar-se diante dos nossos olhos: a tentativa de Francisco de reabilitar o seu amigo íntimo Marko Rupnik. Rupnik usou em série seu ofício sacerdotal e seu status de artista religioso para cometer crimes horríveis de abuso sexual contra irmãs religiosas. “O padre Rupnik é um predador sexual voraz” que “passou várias décadas manipulando e atormentando mulheres vulneráveis para que realizassem fantasias sexuais quase espirituais para sua satisfação”. Rupnik "usou o processo artístico de criação de seu trabalho para preparar e abusar de mulheres. O ato de criar seu trabalho estava ligado ao ato de abusar de suas vítimas, às vezes de maneiras abertamente blasfemas - não eram eventos separados, mas mutuamente dependentes."

Em cada etapa do processo, Francisco agiu para proteger Rupnik. Francisco encontrou-se com Rupnik numa audiência privada em janeiro de 2020; Francisco convidou Rupnik para pregar no retiro anual da Quaresma para a Cúria Romana naquele ano (depois de ter sido considerado culpado de abuso sexual por um tribunal secreto do Vaticano) e, em 2021, a arte de Rupnik foi escolhida como logotipo do Encontro Mundial de Famílias - novamente, apesar das acusações fundamentadas de abuso contra ele. Há apenas três meses, Francisco fez um vídeo elogiando a arte de Rupnik, e a arte de Rupnik continua a ser usada rotineiramente pelo Vaticano para promover o Sínodo sobre a Sinodalidade. Como observou Ed Condon, do The Pillar: “Apesar da queda pública de Rupnik em desgraça e dos detalhes de revirar o estômago de seu abuso de mulheres religiosas, ao longo de décadas, tornando-se conhecido, seu trabalho é usado com tanta frequência pelo Vaticano News que tenho que me perguntar se eles realmente tenham imagens de outros artistas em seus arquivos para usar."

Isso não é tudo. Quando Rupnik foi excomungado em Maio de 2020, a excomunhão foi levantada no mesmo mês – tão rapidamente que é provável que o próprio Francisco estivesse envolvido. Como relatou Ed Pentin: “É inconcebível que o Papa Francisco não tenha sido informado pelo prefeito, Cardeal Ladaria Ferrer, sobre o estado da condenação do Padre Rupnik, ou da sua petição para ser absolvido da sua excomunhão, a menos que o Padre Rupnik tivesse conseguido contornando a congregação e obtendo diretamente de Francisco a absolvição de sua excomunhão declarada." E Francisco recusou-se a renunciar ao prazo de prescrição relativo às queixas contra Rupnik. Como relatou Christopher Altieri, do Catholic World Report, “homens seniores da Igreja próximos de Francisco sugeriram fortemente que Francisco teve praticamente tudo a ver com a gestão [da situação de Rupnik]”. Uma declaração cuidadosamente redigida pelo Cardeal De Donatis, da Diocese de Roma, no final de 2022, pretendia sinalizar a “todos os que lêem e compreendem o curialês que o Papa Francisco está a dar as ordens neste caso, e que o Papa Francisco está  apoiando o Padre Rupnik”. "

Acontecimentos recentes confirmaram que Francisco está determinado a reabilitar Rupnik. Na sexta-feira, 15 de setembro, Francisco teve um encontro com o Diretor do Centro Aletti, instituto de arte e teologia fundado por Rupnik. O diretor com quem Francisco se encontrou defendeu vigorosamente Rupnik, qualificando as acusações contra ele de “não comprovadas e difamatórias”. E então, na segunda-feira, a Diocese de Roma emitiu uma declaração elogiando o Centro Aletti de Rupnik, onde Rupnik “continua a ser um membro bem-vindo da comunidade do centro, apesar da sua desgraça pública e sanção eclesiástica”. A declaração da Diocese elogiou os membros do Centro Aletti porque, apesar do clamor contra Rupnik, eles “optaram por manter o silêncio” e “guardar os seus corações e não reivindicar qualquer irrepreensibilidade para serem juízes dos outros”. E o comunicado procurava reabilitar o próprio Rupnik, pondo em causa os fundamentos da sua breve excomunhão: “Com base no copioso material documental estudado, o visitante conseguiu encontrar, e portanto relatou, procedimentos gravemente anómalos cujo exame também gerou dúvidas fundadas”. sobre o próprio pedido de excomunhão.” Não está claro como “o visitante”, Mons. Giacomo Incitti teria inclusive obtido acesso aos arquivos de uma investigação criminal canônica selada.

A declaração da Diocese de Roma elogiando o Centro Aletti atraiu a condenação generalizada das vítimas de Rupnik e de todo o mundo católico, com as vítimas afirmando que ficaram "sem palavras" por uma declaração que "ridiculariza [sua] dor". Mas é improvável que o Vaticano – e Francisco – notem ou se importem muito. Tudo o que importa é o resultado final: o amigo de Francisco, Rupnik, um ícone do catolicismo pós-Vaticano II, foi protegido

A esta altura, os católicos tradicionais estão familiarizados com o abuso e a corrupção do pontificado de Francisco. Mas a reabilitação aberta e nua feita por Francisco do terrível abusador Rupnik marca um novo ponto baixo para o papado e cria uma nova ferida para a Igreja. Estremecemos ao pensar qual será o próximo ultraje.

Acontecimentos recentes confirmaram que Francisco está determinado a reabilitar Rupnik. Na sexta-feira, 15 de setembro, Francisco teve um encontro com o Diretor do Centro Aletti, instituto de arte e teologia fundado por Rupnik. O diretor com quem Francisco se encontrou defendeu vigorosamente Rupnik, qualificando as acusações contra ele de “não comprovadas e difamatórias”. Um


2) Michael Brendan Dougherty

Agora, de volta a Roma, o papa está a regressar a um dos seus passatempos favoritos: reabilitar uma praga sexual bem documentada porque tem os amigos progressistas certos na Cúria. Desta vez é o Pe. Rupnik, um jesuíta e um artista claramente terrível. Rupnik abusou em série de um grupo de freiras. A investigação do Vaticano sobre Rupnik e o seu centro religioso terminou com um relatório – não estou a brincar – elogiando os seus confrades porque, apesar do alvoroço mediático, eles “optaram por manter o silêncio” e “guardar os seus corações e não reivindicar qualquer irrepreensibilidade com a qual possam atuar como juízes dos outros.” Em outras palavras, bom trabalho em manter a omertà e não julgar tanto o criminoso sexual entre vocês.

Tudo isto é uma preparação para o alardeado “Sínodo sobre a Sinodalidade”, que é literalmente uma conferência de bispos que se dilata com base na autoridade das conferências de bispos. O objetivo do Sínodo, muito claramente, é que um grande grupo de bispos debata entre si sobre o material de pesquisa que eles orientaram um pequeno número de católicos leigos em sua diocese de origem, e se esta pilha de papéis dá cobertura suficiente para o papa começar a descartar certos ensinamentos morais e dogmáticos da Igreja em favor de novos entendimentos. É um exercício verdadeiramente estranho destinado a obscurecer o papel do papa na mudança da fé. Basicamente, ele vai pedir a um grupo de bispos que escrevam um documento mostrando que a Igreja em geral chegou a uma nova compreensão de si mesma.

É difícil desvendar o quanto isso já é um fracasso. A própria ideia de um “Sínodo sobre Sinodalidade” é como realizar um Encontro sobre Encontros. Aquele desconfortável som gutural e silvo que você ouve de Roma é a cobra eclesial engasgando com o próprio rabo. Os constantes comentários do Papa sobre o “atraso” e as condenações da “ideologia” são a sua tentativa de ultrapassar a ideia de que a fé católica tem uma substância intelectual real que foi definida, clarificada e destilada ao longo dos tempos. Este processo pelo qual as primeiras declarações bíblicas e litúrgicas sobre a divindade de Jesus Cristo, a natureza do Espírito Santo e Deus Pai são - ao longo dos séculos - expressas em novos termos como “a Santíssima Trindade” é o que São John Henry Newman chamado de “desenvolvimento da doutrina”. Newman tinha regras para distinguir entre desenvolvimento verdadeiro e falso, remontando a São Vicente de Lérins. “Um verdadeiro desenvolvimento é aquele que é conservador em relação ao seu original”, escreveu Newman, “e uma corrupção é aquela que tende à sua destruição”. A lei da não contradição se aplica.

Mas o Papa Francisco não opera assim. Ele já afirmou ter “desenvolvido” a doutrina para transformar em pecado a ideia da pena de morte, formalmente reconhecida como moralmente permissível pela Igreja. Ele fez isso afirmando que alguma nova compreensão da dignidade humana havia surgido na história. E este novo entendimento, combinado com uma série de observações sociais mal definidas e opiniões de que as prisões eram agora suficientes para proteger o público dos criminosos, tornou a pena de morte moralmente inadmissível.

..

Mas está bastante claro hoje em dia que os maiores fãs do Papa Francisco querem que ele use a autoridade papal para condenar os tradicionalistas morais, sociais e litúrgicos, e até mesmo para rever ou reformar significativamente o ensino da Igreja sobre as questões associadas aos tradicionalistas morais e sociais: a proibição da Igreja de contracepção artificial, a reserva do Santo Matrimônio para homens e mulheres, a reserva das Ordens Sagradas para os homens. O atual chefe da Congregação para a Doutrina da Fé do papa – o cargo anteriormente usado para ajudar os papas a proteger a ortodoxia – agora fala corajosamente sobre a “doutrina do Santo Padre”, como se os entusiasmos morais pessoais do Papa Francisco fossem obrigatórios para todos. Às vezes, eles até falam do dever cristão para com o “magistério atual” da Igreja, em vez do “perene”.

Mas devo alertá-los de que o esforço é contraproducente. Uma igreja de hoje que pretende libertar-nos da igreja de ontem é uma igreja que confessa a sua irrelevância. Afinal, implica a existência de uma igreja do futuro, que pode e pode muito bem ser qualquer coisa. O ofício do papado tem - desde o tempo dos Apóstolos - sido encarregado da preservação e conservação, não da inovação. É por isso que seus ocupantes costumavam fazer juramentos tão assustadores, prometendo fidelidade ao que lhes era entregue. A tentativa de utilizá-lo para outros fins só causará danos ao ofício. Na verdade, isso é precisamente tudo o que o Papa Francisco conseguiu. O culto papal que continuou a crescer desde o primeiro Concílio Vaticano e atingiu o seu apogeu sob João Paulo II desabou. Ainda há muito para cair.

 

quarta-feira, 20 de setembro de 2023

Resposta para: "Você Acha Que É Mais Católico que o Papa".

 


Muitas vezes quando se critica atos e palavras do papa Francisco aparece alguém e diz: "você acha que é mais católico que o papa? Ele é o papa, você é só um leigo (ou um padre, ou um bispo, ou um cardeal)".

Eu nunca dei muita atenção para esse tipo de crítica pois é uma conhecida falácia, a falácia da autoridade: usar o nome de uma autoridade para evitar discutir a questão em debate.

Mas o filósofo Edward Feser escreveu um excelente artigo para responder a este argumento, com base no que falou São Tomás de Aquino sobre a correção que São Paulo fez diretamente a São Pedro (o primeiro papa) no chamado "incidente de Antioquia".

Traduzo abaixo:

Tomás de Aquino sobre a correção de São Pedro por São Paulo

por Edward Feser

Um papa fala ex cathedra quando apresenta algum ensinamento de uma maneira formal e definitiva que se destina infalivelmente a resolver o debate sobre ele de uma vez por todas. Este é um exercício do que é chamado de “magistério extraordinário”, e os católicos são obrigados a dar a tais declarações o seu consentimento sem reservas. O magistério ordinário da Igreja também pode ensinar infalivelmente sob certas circunstâncias, e também aqui tal ensino merece consentimento sem reservas. Mesmo quando o papa ou a Igreja ensinam sobre uma questão de fé ou moral de uma forma que não é infalível, os católicos normalmente devem a esse ensinamento o que é chamado de “assentimento religioso”, uma adesão que não é absoluta, mas, no entanto, firme.

No entanto, pode haver muito raras excepções em que aqueles versados em alguma questão de fé ou moral que detectam dificuldades numa declaração magisterial são permitidos respeitosamente levantar objecções a ela e pedir esclarecimentos à Igreja. Isto foi explicitamente reconhecido na instrução Donum Veritatis emitida pelo Cardeal Joseph Ratzinger sob o Papa São João Paulo II. O tipo mais claro de caso em que isto seria permitido envolveria uma declaração magisterial que parece entrar em conflito com o ensinamento anteriormente estabelecido da Igreja, e a Donum Veritatis distingue explicitamente a crítica respeitosa do tipo em questão da “dissidência” do ensinamento tradicional da Igreja.

O ensinamento de Donum Veritatis não é de forma alguma uma novidade, mas tem raízes profundas na tradição da Igreja. Entre os precedentes mais importantes está o ensinamento de São Tomás de Aquino sobre a correção de São Pedro por São Paulo, e como esse episódio ilustra como os católicos podem, em casos raros, ter o direito e até o dever de corrigir os seus prelados. Discuti o ensinamento de Tomás de Aquino naquele artigo anterior, mas aqui quero examiná-lo com mais detalhes.

A primeira coisa a notar é que a posição de Tomás de Aquino não reflecte de forma alguma uma concepção mais fraca da autoridade papal do que aquela que prevaleceu nos séculos posteriores. Pelo contrário, na Summa Theologiae São Tomás escreve:

[A] promulgação de um credo pertence à autoridade daquele que tem autoridade para fixar, em forma de sentenças, as coisas que pertencem à Fé (ea quae sunt fidei), para que possam ser mantidas por todos com uma fé inabalável.

Agora, isso pertence à autoridade do Sumo Pontífice, “a quem”, como Decretais, dist. 17 diz: “são referidas as questões maiores e mais difíceis na Igreja”. Portanto, em Lucas 22:32, nosso Senhor disse a Pedro, a quem Ele constituiu como Sumo Pontífice: “Roguei por ti, Pedro, para que a tua fé não desfaleça; e quando você se converter, fortaleça seus irmãos”.

E a razão para isto é que a Fé deve ser uma para toda a Igreja – isto de acordo com 1 Coríntios 1:10 (“... para que todos professem a mesma coisa, e que não haja cismas entre vós”) . Mas esta condição não poderia ser preservada a menos que uma questão sobre a Fé que surge da Fé fosse determinada por alguém que preside toda a Igreja, de tal forma que a sua decisão (sententia) seja firmemente mantida por toda a Igreja.

E assim a nova promulgação de um credo pertence exclusivamente à autoridade do Sumo Pontífice, assim como todas as outras coisas que pertencem à Igreja como um todo, como a convocação de um concílio geral e outras coisas deste tipo. (Summa Theologiae II-II.1.10, tradução Freddoso)

Note-se que Tomás de Aquino caracteriza aqui o Sumo Pontífice ou papa como tendo autoridade para resolver disputas doutrinárias de tal forma que as suas decisões devem ser “mantidas com firmeza” e, na verdade, com “fé inabalável” pelos católicos. E ele descreve Pedro como Sumo Pontífice. 

No entanto, ele também em outro lugar aprova a correção de Pedro feita por Paulo e vê nela um exemplo a ser seguido pelos católicos posteriores. Como essas duas coisas podem ser verdadeiras? A resposta, obviamente, é que Tomás de Aquino, tal como a Igreja hoje, reconhece uma distinção entre o ensino papal ex cathedra e o ensino papal de natureza menos definitiva. E como a Igreja hoje, ele reconhece que, em certas circunstâncias, esta pode não só estar errada, mas até mesmo sujeita a críticas por parte dos fiéis.

Que circunstâncias seriam essas? Vejamos o que diz Tomás de Aquino. Os textos relevantes podem ser encontrados na Summa Theologiae II-II.33.4 e no Comentário de Tomás de Aquino sobre a Carta de São Paulo aos Gálatas, no Capítulo 2, Aula 3. O comentário discute com alguns detalhes o famoso incidente quando Paulo repreendeu publicamente Pedro. Para contextualizar, eis como o artigo da Enciclopédia Católica sobre São Pedro resume o que aconteceu:

Enquanto Paulo morava em Antioquia… São Pedro chegou lá e se misturou livremente com os cristãos não-judeus da comunidade, frequentando suas casas e compartilhando suas refeições. Mas quando os judeus cristianizados chegaram a Jerusalém, Pedro, temendo que esses rígidos observadores da lei cerimonial judaica ficassem escandalizados com isso, e que sua influência sobre os cristãos judeus fosse ameaçada, evitou daí em diante comer com os incircuncisos.

Sua conduta causou grande impressão nos outros cristãos judeus de Antioquia, de modo que até Barnabé, companheiro de São Paulo, agora evitava comer com os pagãos cristianizados. Como esta ação era totalmente contrária aos princípios e práticas de Paulo, e poderia levar à confusão entre os pagãos convertidos, este Apóstolo dirigiu uma reprovação pública a São Pedro, porque sua conduta parecia indicar um desejo de obrigar os convertidos pagãos a se tornarem judeus e aceitarem a circuncisão e a lei judaica.

Fim da citação. Observe que embora tenham sido as ações de Pedro, e não as suas palavras, que causaram o problema, a controvérsia era, no entanto, de natureza doutrinária. Pois foram “princípios”, bem como práticas sólidas, que Paulo procurou defender em face do mau exemplo de Pedro e, em particular, ele desejava evitar que outros fossem levados ao erro doutrinário de supor que “os convertidos pagãos [eram obrigados] a tornem-se judeus e aceitem a circuncisão e a lei judaica”.

Foi exatamente assim que Tomás de Aquino viu a situação. No comentário de Gálatas, ele diz que o que Pedro havia feito representava “perigo para o ensino do Evangelho”, e que Pedro e aqueles que seguiram seu exemplo “não andaram retamente para a verdade do Evangelho, porque sua verdade estava sendo desfeita” (ênfase adicionado). Pedro falhou em cumprir o seu dever na medida em que “a verdade deve ser pregada abertamente e o contrário nunca tolerado por medo de escandalizar os outros”. É claro, então, que na opinião de Tomás de Aquino o problema não era apenas o fato de Pedro ter agido mal, mas também o fato de ele parecer tolerar o erro doutrinal e arriscar-se a levar outros a fazer o mesmo.

Um segundo ponto que Tomás de Aquino destaca no comentário de Gálatas é que Paulo repreendeu Pedro “abertamente”, “não em segredo… mas publicamente”. E ele diz que “a forma da repreensão foi adequada, isto é, pública e clara” porque a “dissimulação de Pedro representava um perigo para todos”.

Um terceiro ponto que Tomás de Aquino destaca aqui é que esta repreensão, no entanto, não foi uma questão de usurpar a autoridade de Pedro. Tomás de Aquino diz que “o Apóstolo se opôs a Pedro no exercício da autoridade, não na sua autoridade de governar” (grifo nosso). 

Para Tomás de Aquino, não é que Pedro não tivesse autoridade papal, mas sim que, neste caso, o seu exercício da mesma equivalia a um abuso. O que Paulo estava fazendo era lembrar a Pedro de cumprir seu dever. Desta forma, diz Tomás de Aquino, Paulo “beneficiou” Pedro e “mostra como ajudou Pedro corrigindo-o”.

Por fim, Tomás de Aquino propõe o seguinte como lição deste episódio:

Portanto, do exposto temos um exemplo: os prelados, aliás, têm um exemplo de humildade, para que não desdenhem as correções daqueles que são inferiores e sujeitos a elas; os súditos têm um exemplo de zelo e liberdade, para que não temam corrigir os seus prelados, especialmente se o seu crime for público e beirar o perigo para a multidão.

Dado que o papa é um prelado, e o exemplo envolveu nada menos que Pedro, o primeiro papa, é óbvio que Tomás de Aquino pretende que esta lição se aplique aos papas e não apenas aos prelados menores.

Na Summa, Tomás de Aquino faz observações semelhantes, mas também acrescenta alguns pontos adicionais cruciais. Vale a pena citar detalhadamente a passagem:

A correção [F]raterna é uma obra de misericórdia. Portanto, mesmo os prelados devem ser corrigidos...

Um súdito não é competente para administrar ao seu prelado a correção que é um ato de justiça através da natureza coercitiva da punição: mas a correção fraterna que é um ato de caridade é da competência de todos em relação a qualquer pessoa para com quem ele é vinculado pela caridade, desde que haja algo naquela pessoa que exija correção...

Visto, porém, que um ato virtuoso precisa ser moderado pelas devidas circunstâncias, segue-se que quando um súdito corrige seu prelado, ele deve fazê-lo de maneira apropriada, não com atrevimento e aspereza, mas com gentileza e respeito…

Parece que um súdito toca excessivamente o seu prelado quando o repreende com insolência, como também quando fala mal dele...

Resistir a alguém em público excede o modo de correção fraterna, e assim Paulo não teria resistido a Pedro, a menos que ele fosse de alguma forma igual a ele no que diz respeito à defesa da fé. Mas quem não é igual pode repreender privada e respeitosamente... Deve-se observar, porém, que se a fé estiver ameaçada, um súdito deve repreender seu prelado, mesmo publicamente. Conseqüentemente, Paulo, que era súdito de Pedro, repreendeu-o em público, por causa do perigo iminente de escândalo relativo à fé, e, como diz a glosa de Agostinho em Gálatas 2:11: “Pedro deu um exemplo aos superiores, que se em algum momento sempre que se desviarem do caminho reto, não deverão desdenhar de ser reprovados por seus súditos.”

Presumir-se simplesmente melhor que seu prelado pareceria ter sabor de orgulho presunçoso; mas não há presunção em se considerar melhor em algum aspecto, porque, nesta vida, nenhum homem está isento de algum defeito. Devemos também lembrar que quando um homem reprova caridosamente o seu prelado, não se segue que ele se considere melhor, mas apenas que ele oferece a sua ajuda a alguém que, “estar na posição mais elevada entre vós, está, portanto, em maior perigo, ” como Agostinho observa em sua Regra citada acima.

Também aqui Tomás de Aquino ensina que os prelados podem por vezes errar de uma forma que ameaça a fé; que quando isso ocorre eles podem ser corrigidos pelos seus súditos; que esta correção possa ocorrer publicamente; que se trata de ajudar um prelado, e que o prelado deve estar aberto a aceitar tal ajuda; e (visto que o seu exemplo é mais uma vez a correção de Paulo a Pedro) que tudo isto se aplica até mesmo aos papas. Mas ele destaca ainda o ponto importante de que é errado objetar que os súditos que corrigem os prelados excedem assim a sua autoridade, ou que tais súditos são culpados de um pecado de orgulho.

Em resposta à primeira objeção, Tomás de Aquino diz que o que falta aos sujeitos é o direito de realizar um certo tipo de correção, nomeadamente o tipo “que é um ato de justiça através da natureza coercitiva da punição”. Por outras palavras, um prelado que abusa da sua autoridade da forma como Tomás de Aquino tem em vista não perde por isso a sua autoridade. Ele ainda é um prelado com toda a autoridade que isso implica, e quem o corrige ainda está sujeito a ele. Conseqüentemente, o súdito não pode punir um prelado por seus erros, destituí-lo do cargo ou algo semelhante. Mas isso não significa que ele não possa simplesmente apontar ao prelado que está errado. Não há nisso uma usurpação de autoridade, diz Tomás de Aquino, mas sim um “ato de caridade” de natureza “fraterna”. Em resposta à segunda objeção, Tomás de Aquino salienta que simplesmente não é verdade que a correção de um prelado deva ser motivada pelo pecado do orgulho. Em vez disso, pode ser motivado pela caridade e pelo desejo de ajudar.

Mas isto leva-nos a um ponto adicional, e absolutamente crucial, acrescentado pela discussão na Summa. Visto que um súdito permanece súdito, mesmo a correção justificável de um prelado não deve ser realizada com “insolência”, “atrevimento” ou “aspereza”, mas sim “de maneira apropriada”, “caridosa” e “com gentileza e respeito." E como Tomás de Aquino diz em outro lugar, é irrelevante se o prelado que precisa de correção é um homem mau. Pois o cargo que ele ocupa pertence a Cristo, e esse cargo, portanto, merece honra, quer o homem que o ocupa o faça ou não.

Aplicado ao caso de um papa, o ensinamento de Tomás de Aquino sobre a correção dos prelados pelos seus súditos pode ser resumido nos seguintes pontos:

1. Quando um papa não faz uma definição ex cathedra, é possível que ele não cumpra o seu dever de defender a doutrina ortodoxa, de uma forma que pareça tolerar o seu oposto.

2. Quando isto ocorre, é permitido aos fiéis corrigi-lo, e fazê-lo publicamente se o seu erro for público e ameaçar enganar muitos.

3. Isto não constitui de forma alguma um desafio à autoridade do Papa ou uma manifestação de orgulho, mas, pelo contrário, constitui uma assistência caridosa ao Papa no exercício adequado da sua autoridade.

4. Contudo, tal correção só deve ser feita de forma humilde e respeitosa, e nunca com insolência ou aspereza.

5. Quando tais críticas respeitosas são feitas, o papa deve responder-lhes com humildade.

Como observei no artigo acima mencionado, a posição de Tomás de Aquino não é de forma alguma única na tradição. Ensinamento semelhante pode ser encontrado nos escritos de São Roberto Belarmino, São João Henry Newman e outros teólogos eminentes da história católica. São Francisco de Sales escreveu:

Assim, não dizemos que o Papa não pode errar nas suas opiniões privadas, como fez João XXII, ou ser totalmente um herege, como talvez fosse Honório... Quando ele erra na sua opinião privada, deve ser instruído, aconselhado, convencido; como aconteceu com João XXII… Portanto, tudo o que o Papa diz não é direito canónico nem obrigação legal; ele deve pretender definir e estabelecer a lei para as ovelhas, e deve manter a devida ordem e forma... E, novamente, não devemos pensar que em tudo e em todos os lugares o seu julgamento é infalível, mas somente quando ele julga sobre um questão de fé em questões necessárias a toda a Igreja; pois em casos particulares que dependem de fatos humanos ele pode errar, não há dúvida, embora não caiba a nós controlá-lo nesses casos, exceto com toda reverência, submissão e discrição. (A controvérsia católica, pp. 225-26)

Naturalmente, tais declarações levantam outras questões e exigem qualificações de vários tipos. Donum Veritatis aborda alguns deles, assim como outras declarações feitas pelo Cardeal Ratzinger durante o pontificado de João Paulo II. E, novamente, como mostra o ensinamento de Tomás de Aquino e de outros santos e teólogos aqui citados, Donum Veritatis não acrescenta nenhuma novidade à tradição, mas baseia-se no que já existia há muito tempo.



terça-feira, 19 de setembro de 2023

O Que Fazer com um Papa Herético? Bispo Schneider Responde


Com o pontificado de Francisco, com base em suas palavras e ações, muitos começaram a se questionar qual é o processo na Igreja para afastar um papa herético.

No meu e-book sobre o Papa Francisco,  eu explico como se define um herético, essa parte não é muito complexa, mas realmente há muitas dificuldades legais na Igreja sobre como afastar um herético que chegou a papa. A Igreja já teve alguns papas heréticos,  mas a definição deles como tal pelos cardeais em geral só ocorrem após a morte deles. E até hoje há quem os defenda.  O caso de Francisco nos assusta quase diariamente.

Mesmo que não possamos destituí-lo, não precisamos, nem devemos, seguir as heresias propagadas.

O bispo Schneider escreveu um excelente texto  sobre como se retira um papa herético

Traduzo abaixo:

Bispo Schneider: Sobre a validade do Pontificado do Papa Francisco

Não há autoridade para declarar ou considerar um Papa eleito e geralmente aceite como um Papa inválido. A prática constante da Igreja torna evidente que mesmo no caso de uma eleição inválida, esta eleição inválida será de facto curada através da aceitação geral dos novos eleitos pela esmagadora maioria dos cardeais e bispos.

Mesmo no caso de um papa herético, ele não perderá o seu cargo automaticamente e não há nenhum órgão dentro da Igreja que o declare deposto por causa de heresia. Tais ações aproximar-se-iam de uma espécie de heresia do conciliarismo ou do episcopalismo. A heresia do conciliarismo ou episcopalismo diz basicamente que existe um órgão dentro da Igreja (Concílio Ecuménico, Sínodo, Colégio dos Cardeais, Colégio dos Bispos), que pode emitir um julgamento juridicamente vinculativo sobre o Papa.

A teoria da perda automática do papado devido à heresia permanece apenas uma opinião, e mesmo São Roberto Belarmino percebeu isso e não a apresentou como um ensinamento do próprio Magistério. O perene Magistério papal nunca ensinou tal opção. Em 1917, com a entrada em vigor do Código de Direito Canônico (Codex Iuris Canonici), o Magistério da Igreja eliminou da nova legislação a observação do Decretum Gratiani no antigo Corpus Iuris Canonici, que afirmava que um Papa, que se desvia da doutrina correta, pode ser deposto. Nunca na história o Magistério da Igreja admitiu quaisquer procedimentos canônicos de deposição de um papa herético. A Igreja não tem poder formal ou judicial sobre o papa. A tradição católica mais segura diz que, no caso de um papa herético, os membros da Igreja podem evitá-lo, resistir-lhe, recusar-se a obedecê-lo, tudo isso pode ser feito sem exigir uma teoria ou opinião, que diz que um papa herético perde automaticamente o seu cargo ou pode ser deposto consequentemente.

Sendo assim, devemos seguir o caminho mais seguro (via tutior) e abster-nos de defender a mera opinião dos teólogos (mesmo que sejam santos como São Roberto Belarmino), que diz que um papa herético perde automaticamente o seu cargo ou pode ser deposto pela Igreja, portanto.

O papa não pode cometer heresia quando fala ex cathedra, este é um dogma de fé. Contudo, no seu ensino fora das declarações ex cathedra, ele pode cometer ambiguidades doutrinárias, erros e até heresias. E uma vez que o papa não é idêntico a toda a Igreja, a Igreja é mais forte do que um único Papa errante ou herético. Nesse caso, deve-se corrigi-lo respeitosamente (evitando a raiva puramente humana e a linguagem desrespeitosa), resistir-lhe como se resistiria a um mau pai de família. No entanto, os membros de uma família não podem declarar o seu pai mau deposto da paternidade. Podem corrigi-lo, recusar-se a obedecê-lo, separar-se dele, mas não podem declará-lo deposto.

Os bons católicos conhecem a verdade e devem proclamá-la, oferecer reparação pelos erros de um Papa que errou. Visto que o caso de um papa herético é humanamente insolúvel, devemos implorar com fé sobrenatural uma intervenção divina, porque esse singular Papa errante não é eterno, mas temporal, e a Igreja não está em nossas mãos, mas nas mãos todo-poderosas de Deus.

Devemos ter bastante fé sobrenatural, confiança, humildade, espírito da Cruz para suportar uma provação tão extraordinária. Em situações tão relativamente curtas (em comparação com 2000 anos) não devemos ceder a uma reacção demasiado humana e a uma solução fácil (declarar a invalidez do seu pontificado), mas devemos manter a sobriedade (manter a cabeça fria) e ao mesmo tempo uma verdadeira visão sobrenatural e confiança na intervenção divina e na indestrutibilidade da Igreja.


sábado, 16 de setembro de 2023

Javier Milei Critica Papa, China, Lula, Putin, Aborto e Mudança Climática.


O jornalista mais assistido do planeta, Tucker Carlson, resolveu ir na Argentina e entrevistar Javier Milei, que se candidata a presidência do país como candidato libertário.

Para mim, o libertarianismo é uma ideologia que ofende a Deus, pois costuma desprezar a ética. E o libertarianismo estimula o próprio comunismo. Mas Milei acertou em muitas respostas, durante a entrevista, mas também mostrou diversos problemas típicos de libertários.

Milei é bem mais inteligente e bem melhor formado academicamente sobre aquilo que defende do que Bolsonaro. Milei leu realmente os livros que formam a ideologia libertária. Sabe o que está falando e é articulado nas respostas.  
 
Na entrevista, Milei detonou o papa Francisco como apoiador de comunistas assassinos que promove a inveja e o roubo travestidos de justiça social.

Disse que era contra o aborto, pois era um assassinato. Uma coisa que não é tanto política libertária, mas ética, pois o libertarianismo ideologicamente vai exaltar muito a liberdade. Por isso mesmo eles costumam aceitar contraceptivos (que podem ser um tipo de aborto), ao contrário do catolicismo. E aceitar coisas como casamento gay, assunto que Carlson não perguntou.

Disse que a agenda da mudança climática é uma agenda de morte e destruição, no que tem toda razão. 

Disse que como governante não irá fazer qualquer negócio com China, com Putin ou com Lula, mas que permitirá que os argentinos assim o façam. O que é claramente hipócrita, mas também claramente libertário. 
 
Ao fim disse que acredita que o sistema judiciário estará do lado da lei e da liberdade durante o governo dele. Hummm...aqui ele errou feio, achou que a ética socialista ou corrupta não estará na cabeça de juízes.

Enfim, como acontece com libertários, eles costumam acreditar em princípios básicos de liberdade e acreditar que a maioria das pessoas pensam como eles e assim terão sucesso. 

A ideia de pecado original não ocorre aos libertários.



sexta-feira, 15 de setembro de 2023

José Ureta: "Questionar Francisco É Defender a Fé , Não é Ideologia"

 




O chileno José Antonio Ureta, autor conhecido internacionalmente sobre doutrina da Igreja, e um dos autores do livro recente "Caminho Sinodal, Uma Caixa de Pandora", traduzido para diversas línguas, escreveu um artigo EXCELENTE no último dia 12 para o site do jornalista inglês Edward Pentin, defendendo suas críticas ao papa Francisco.

Traduzo abaixo a entrevista:

Questionar a Evolução da Doutrina e da Moral do Papa Francisco não é Ideologia nem Atraso, mas Permanecer Firme na Fé.

por José Antonio Ureta

Nas últimas semanas, o Papa Francisco repetiu que os críticos dos novos desenvolvimentos que ele está introduzindo na Igreja são vítimas da “ideologia”. Na sua opinião, isto acontece porque se recusam a incorporar a doutrina católica nas vicissitudes da vida quotidiana dos baptizados e dos seus compatriotas.

Na sua controversa conversa com os jesuítas portugueses à margem da Jornada Mundial da Juventude, o papa atacou o suposto atraso (indietrismo) da hierarquia e dos leigos americanos: “A visão da doutrina da Igreja como monolítica é errada”. Porque em “um clima de fechamento. . . . [você] pode perder a verdadeira tradição e recorrer a ideologias em busca de apoio. Por outras palavras, a ideologia substitui a fé, a pertença a um sector da Igreja substitui a pertença à Igreja.” Ele acrescentou: “Esses grupos americanos de que você fala, tão fechados, estão se isolando. Em vez de viverem pela doutrina, pela doutrina verdadeira que sempre se desenvolve e dá frutos, vivem por ideologias. Quando você abandona a doutrina na vida para substituí-la por uma ideologia, você perde, você perde como na guerra.”

Durante a conferência de imprensa no voo de regresso da Mongólia, em 4 de setembro, o Papa Francisco voltou a esta dicotomia doutrina versus ideologia. Solicitado a abordar a irritação causada pelos elogios aos autocratas russos Pedro, o Grande e Catarina II, o papa declarou:

"Há imperialismos que querem impor a sua ideologia. Paro por aqui: quando a cultura é destilada e transformada em ideologia, ela é veneno. A cultura é usada, mas destilada em ideologia. Devemos distinguir a cultura de um povo das ideologias que então surgem de algum filósofo, de algum político desse povo. E digo isto para todos, também para a Igreja.

Dentro da Igreja existem muitas vezes ideologias que separam a Igreja da vida que vem da raiz e vai para cima. Eles separam a Igreja da influência do Espírito Santo.

Uma ideologia é incapaz de encarnar; é apenas uma ideia. Mas quando a ideologia ganha força e vira política, geralmente vira ditadura, certo? Torna-se uma incapacidade de dialogar, de avançar com as culturas. E os imperialismos fazem isso. O imperialismo sempre se consolida a partir de uma ideologia.

Também na Igreja devemos distinguir doutrina de ideologia: a verdadeira doutrina nunca é ideológica, nunca. Está enraizado no povo santo e fiel de Deus. Em vez disso, a ideologia está desligada da realidade, desligada do povo. . ."

Questionado mais tarde sobre como evitar a polarização no próximo Sínodo, o Papa Francisco respondeu: “Não há lugar para ideologia no Sínodo. . . . O Sínodo trata do diálogo: entre os batizados, entre os membros da Igreja, sobre a vida da Igreja, sobre o diálogo com o mundo, sobre os problemas que afetam a humanidade hoje”.

Um jornalista da Vida Nueva referiu-se então ao prefácio de O Processo Sinodal é uma Caixa de Pandora (do qual sou coautor), onde o Cardeal Raymond Burke advertiu que calamidades emergiriam do Sínodo. O repórter espanhol perguntou o que o papa pensava desta posição e se ela poderia influenciar a assembleia de Roma. Tendo primeiro evitado a questão para contar a história de alguns carmelitas que temiam o Sínodo, o papa abordou-a genericamente: “Se formos à raiz destas ideias, encontraremos ideologias. Sempre, quando se quer desvincular-se do caminho da comunhão na Igreja, o que sempre o separa é a ideologia. E acusam a Igreja disto ou daquilo, mas nunca fazem acusação do que é verdadeiro: [A Igreja é pecadora.] Nunca falam de pecado. . . Eles defendem uma ‘doutrina’, uma doutrina como a água destilada que não tem sabor e não é a verdadeira doutrina católica, isto é, no Credo.”

O que parece emergir desta linguagem profusa e confusa do papa é que a verdadeira cultura e a verdadeira fé (ou seja, a verdadeira doutrina) seriam uma emanação da alma do povo (e, no caso das doutrinas religiosas, do sensus fidei do povo fiel.) Além disso, a verdadeira cultura e fé permanecem válidas enquanto estiverem incorporadas na alma de um povo. Portanto, a cultura e a doutrina são distorcidas quando se desligam da vida das pessoas através da destilação intelectual. Esse refinamento os transforma na bagagem espiritual de uma minoria que vive enclausurada em torres de marfim e tenta impor imperialisticamente suas convicções assépticas e rígidas ao povo. Os seus princípios estão desligados da vida real dos fiéis.

O que se deve pensar desta compreensão da origem e do desenvolvimento da cultura e da fé?

  • Primeiro, tem sido o eixo filosófico-teológico de todo o pontificado do Papa Francisco.
  • Em segundo lugar, enquadra-se nas suas crenças sócio-políticas, que são fortemente influenciadas pelas conotações populistas da chamada “Teologia do Povo”.
  • Terceiro, foi expressamente condenado pelo Papa São Pio X na sua encíclica antimodernista Pascendi Dominici Gregis.
  • Quarto, é errado subscrever uma suposta evolução da doutrina e da moral católica baseada numa versão truncada do Commonitorium de São Vicente de Lerin. 

Vou expandir cada um desses pontos.

1) O antiintelectualismo do Papa Francisco deriva de uma visão imanentista e teilhardiana do universo e da história, que atribui os impulsos de novas dinâmicas na ação humana a uma ação que é considerada divina. Na sua primeira entrevista à La Civiltà Cattolica, posteriormente reproduzida por revistas jesuítas de todo o mundo, o Papa Francisco explicou ao Pe. Antonio Spadaro: “A nossa não é uma ‘fé de laboratório’, mas uma ‘fé de jornada’, uma fé histórica. Deus revelou-se como história, não como um compêndio de verdades abstratas”. Ele enfatizou ainda:

"Deus se manifesta na revelação histórica, na história. . . . Deus está na história, nos processos. . .

Deus se manifesta no tempo e está presente nos processos da história. Isto dá prioridade a ações que dão origem a novas dinâmicas históricas."

Por causa desta visão, o Papa destacou na Amoris laetitia a necessidade de “concentrar-se nas realidades concretas, uma vez que ‘o chamado e as exigências do Espírito ressoam nos acontecimentos da história’”. Como assim? Através das “constantes tensões presentes em cada realidade social”, como explica na exortação apostólica Evangelii gaudium, porque “as tensões e as oposições podem alcançar uma unidade diversificada e vivificante”, e “o autor principal, o sujeito histórico deste processo , é o povo como um todo e a sua cultura.”

Com base nessas premissas imanentistas e hegelianas, pode-se entender por que o Papa Francisco escreveu na Evangelii gaudium que um dos quatro princípios que orientam suas ações é que “as realidades são maiores que as ideias”.

Este postulado pode ter uma interpretação tomista do tradicional. definição de verdade: “adaequatio intellectus ad rem” [conformidade do pensamento com a coisa que é pensada]. Isto significa que a compreensão adequada e as elaborações conceituais devem basear-se e servir à realidade. 

Contudo, o postulado assume uma conotação diferente no contexto sociológico-pastoral em que está inserido pelo Papa Francisco. Como pe. Giovanni Scalese explicou em 2016: “Significa, em vez disso, que devemos aceitar a realidade como ela é, sem pretender alterá-la com base em princípios absolutos (por exemplo, princípios morais), que são apenas 'ideias' abstratas que na maioria das vezes correm o risco de serem transformadas em ideologia.” “Este postulado”, sublinhou o Padre Scalese, “está na base da contínua polémica do Papa Francisco contra a doutrina.” E continuou: “Na ação humana, somos inevitavelmente guiados por alguns princípios naturalmente abstractos. É inútil, portanto, argumentar sobre o caráter abstrato da “doutrina”, opondo-a a uma “realidade” à qual devemos nos conformar. Se a realidade não for iluminada, guiada e ordenada por alguns princípios, corre o risco de degenerar no caos.”

Porém, como explica o professor Giovanni Turco, para o Papa Francisco a verdade é relativa no sentido pleno da palavra, não no sentido tomista, “como uma relação vital e pragmática que deriva de uma situação. Assim entendida, a verdade não tem conteúdo próprio. Não pode ser ‘absoluta’, isto é, ‘válida para sempre’. Por isso, deixa de ser verdade e se torna mera opinião!”

Mas o que é uma ideologia senão um conjunto de meras opiniões? Assim, a condenação das ideologias por parte do Papa Francisco volta-se contra ele por causa da sua compreensão relativista da “verdade” situacional.

2) No cenário sócio-político latino-americano, esta cosmovisão imanentista e a sua correspondente visão relativista da verdade fundem-se na Teologia do Povo, que se baseia não nas verdades decorrentes da Revelação, mas nos valores concretos e históricos do povo. Numa entrevista com o sociólogo francês Dominique Wolton, o Papa Francisco explicou esta interação:

"Na década de 1980, houve uma tendência para uma análise marxista da realidade, que foi então rebatizada de “teologia do povo”. Não gosto muito desse nome, mas é por esse nome que eu o conhecia. Caminhando com o povo de Deus e engajando-se em uma teologia da cultura.

Há um pensador que você deveria ler: Rodolfo Kusch, um alemão que viveu no noroeste da Argentina, um excelente filósofo antropológico. Ele me ajudou a entender uma coisa: a palavra “povo” não é uma palavra lógica. É uma palavra mítica. Não se pode falar logicamente de um povo, porque seria apenas uma descrição. Para compreender um povo, compreender os valores desse povo, é preciso entrar no espírito, no coração, na obra, na história e no mito da sua tradição. Esse ponto está realmente na raiz da chamada teologia “do povo”. Significa acompanhar as pessoas, ver como elas se expressam."

Comentando esta passagem, o analista vaticano Sandro Magister revelou que “Kusch inspirou-se na filosofia de Heidegger para distinguir entre 'ser' e 'habitar', descrevendo com a primeira categoria a visão racionalista e dominadora do homem ocidental e com a segunda a visão de os povos indígenas latino-americanos, em paz com a natureza e animados por nada menos que um 'mito'”.

3) O problema mais grave com os comentários recentes do Papa Francisco sobre doutrina e ideologia é que parecem muito semelhantes à visão modernista da natureza evolutiva dos dogmas, baseada na falsa crença na evolução da consciência humana.

Como é bem sabido, com algumas diferenças de nuance, os modernistas partilham a convicção de que a Igreja, a sua doutrina e o culto são frutos da consciência humana. Eles identificam a Revelação com uma experiência religiosa chamada “imanência vital” e propõem uma “religião do coração” baseada em verdades que correspondem às novas condições de vida. Assim, para os modernistas, a Igreja e a doutrina devem adaptar-se às necessidades de cada época porque a vida, incluindo a vida cristã, é um esforço contínuo de adaptação às novas condições. Na sua opinião, a fé não é “um consentimento livre a toda a verdade que Deus revelou”, uma vez que isso seria uma expressão de intelectualismo frio. Em vez disso, a fé seria um sentido interior, originado na necessidade do divino latente no subconsciente humano, sem consciência prévia do intelecto. Além disso, a Revelação não seria mais a comunicação de Deus a uma criatura racional de algumas verdades sobre Si mesmo e as leis eternas de Sua vontade, por meios que estão além do curso normal da natureza, verdades que nos são transmitidas pelas Sagradas Escrituras. e Tradição, porque tudo isso seria uma forma de Intelectualismo.

Para os modernistas, a Revelação é uma manifestação direta de Deus à alma através do seu sentido religioso. Os dogmas tornam-se meras fórmulas que fornecem ao crente um meio de explicar a fé a si mesmo. À medida que as condições de vida e a consciência mudam, estas fórmulas, sujeitas às vicissitudes da existência das pessoas, também podem mudar.

Na sua encíclica Pascendi Dominici gregis, o Papa São Pio X denuncia o pensamento modernista “de que as fórmulas religiosas, se quiserem ser realmente religiosas e não apenas especulações intelectuais, devem ser vivas e viver a vida do sentido religioso”. Assim, para os modernistas, é necessário “que o crente. . . não coloque muita ênfase no dogma, como fórmula, mas valer-se dela apenas para se unir à verdade absoluta que a fórmula ao mesmo tempo revela e oculta, isto é, tenta exprimir, mas sem nunca seguir isso.”

A consequência do que foi dito acima é que, para os modernistas, a Igreja deve evoluir “pela necessidade de se adaptar às condições históricas e de se harmonizar com as formas existentes de sociedade”. Esta evolução avança através do conflito e do compromisso entre duas forças, como disse Pio X:

"A força conservadora existe na Igreja e se encontra na tradição; a tradição é representada pela autoridade religiosa, e isto tanto de direito como de fato. Por direito, pois é da própria natureza da autoridade proteger a tradição: e de facto, uma vez que a autoridade, elevada como está acima das contingências da vida, quase não sente, ou nem sequer sente, os estímulos do progresso. A força progressista, pelo contrário, que responde às necessidades interiores, reside nas consciências individuais e nelas actua, especialmente naquelas que estão em contacto mais próximo e íntimo com a vida." (São Pio X)

Do ponto de vista modernista, se a Igreja se recusasse a acompanhar esta evolução da vida e da consciência humana, permaneceria uma estrutura rígida, pregando uma “ideologia” ultrapassada, tão insípida como água destilada. Prevendo esta acusação, São Pio X denunciou na sua encíclica os perigos das teorias anti-intelectualistas do Modernismo:

"Retire a inteligência e o homem, já inclinado a seguir os sentidos, torna-se seu escravo. . . . Todas essas fantasias do senso religioso nunca serão capazes de destruir o bom senso, e o bom senso nos diz que a emoção e tudo o que leva o coração cativo revela-se um obstáculo em vez de uma ajuda para a descoberta da verdade. Falamos da verdade em si - pois aquela outra verdade puramente subjetiva, fruto do sentido e da ação internos, se servir ao seu propósito para o jogo de palavras, não traz nenhum benefício para o homem que deseja, acima de todas as coisas, saber se fora Para si mesmo, existe um Deus em cujas mãos ele um dia cairá." (São Pio X)

4) Na conversa acima mencionada com os jesuítas portugueses, o Papa Francisco opinou que a atitude “reacionária” da Igreja Americana é informada pelo atraso. Ao explicar a sua desaprovação, o Papa Francisco afirmou

"há uma evolução adequada na compreensão das questões de fé e de moral, desde que sigamos os três critérios que Vicente de Lerins já indicava no século V: a doutrina evolui ut annis consolidetur, dilatetur tempore, sublimetur aetate. Em outras palavras, a doutrina também progride, se expande e se consolida com o tempo e se torna mais firme, mas está sempre progredindo. A mudança desenvolve-se da raiz para cima, crescendo de acordo com estes três critérios. . . .

. . . Sempre neste caminho, começando pela raiz com a seiva que sobe cada vez mais, e por isso a mudança é necessária.

Vicente de Lerins faz a comparação entre o desenvolvimento biológico humano e a transmissão de uma época para outra do depositum fidei, que cresce e se consolida com o passar do tempo. Aqui, a nossa compreensão da pessoa humana muda com o tempo e a nossa consciência também se aprofunda. As outras ciências e a sua evolução também ajudam a Igreja neste crescimento de compreensão. A visão da doutrina da Igreja como monolítica é errônea."

Três observações serão feitas sobre essas passagens.

Em primeiro lugar, deve-se notar como o Papa Francisco estabelece, de forma modernista, o crescimento da consciência humana, auxiliado pela ciência, como a motivação fundamental para o progresso da doutrina.

Em segundo lugar, quando afirma que tal crescimento flui das raízes para cima, o Papa Francisco não se refere aos ensinamentos de Nosso Senhor e dos Apóstolos, mas sim à “influência do Espírito Santo” no “povo santo e fiel de Deus” mencionado durante sua coletiva de imprensa no avião voltando da Mongólia.

Terceiro, o Papa Francisco trunca conscientemente o Commonitorium de São Vicente de Lerins, como foi amplamente demonstrado por Mons. Thomas G. Guarino:

"Há um crescimento arquitetônico orgânico ao longo do tempo – tanto nos seres humanos quanto na doutrina cristã. Mas este progresso, argumenta Vicente, deve ser de um certo tipo e forma, protegendo sempre as conquistas doutrinárias anteriores da fé cristã. Uma mudança não pode criar um significado diferente. Em vez disso, as formulações posteriores devem estar “de acordo com a mesma doutrina, o mesmo significado e o mesmo julgamento” que as anteriores. . .

. . . Se eu fosse aconselhar o papa, eu o encorajaria a levar em conta todo o Commonitorium de São Vicente, e não apenas a seleção que ele cita repetidamente.

Observe que São Vicente nunca fala positivamente sobre reversões. Uma reversão, para Vicente, não é um avanço na compreensão da verdade por parte da Igreja; não é um exemplo de ensino “ampliado pelo tempo”. Pelo contrário, as reversões são a marca registrada dos hereges. . . .

Gostaria também de convidar o Papa Francisco a invocar as barreiras salutares que Vicente ergue para garantir um desenvolvimento adequado. Enquanto o Papa Francisco é levado pela frase de Vicente dilatetur tempore (“ampliado pelo tempo”), o Leriniano também usa a sugestiva frase res amplicetur in se (“a coisa cresce dentro de si”). O Leriniano argumenta que existem dois tipos de mudança: Uma mudança legítima, um profectus, é um avanço – crescimento homogéneo ao longo do tempo – como uma criança que se torna adulta. Uma mudança imprópria é uma deformação perniciosa, chamada permutatio. Esta é uma mudança na própria essência de alguém ou de algo, como uma roseira se transformando em meros espinhos e abrolhos. . . .

Outra proteção é a afirmação vicentina de que o crescimento e a mudança devem ocorrer in eodem sensu eademque sententia, isto é, de acordo com o mesmo significado e o mesmo julgamento. Para o monge de Lérins, qualquer crescimento ou desenvolvimento ao longo do tempo deve preservar o significado substantivo dos ensinamentos anteriores. Por exemplo, a Igreja pode certamente crescer na sua compreensão da humanidade e da divindade de Jesus Cristo, mas nunca pode voltar atrás na definição de Nicéia. O idem sensus ou “mesmo significado” deve ser sempre mantido em qualquer desenvolvimento futuro. O Papa Francisco raramente, ou nunca, cita esta importante frase vicentina - mas qualquer apelo à mudança deve ser demonstrado não como sendo simplesmente uma alteração, ou mesmo uma reversão do ensinamento anterior, mas de facto em eodem sensu com aquele que o precedeu.

Eu também aconselharia o Papa a evitar citar São Vicente para apoiar reversões, como acontece com o seu ensinamento de que a pena de morte é “per se contrária ao Evangelho”. A compreensão orgânica e linear de Vincent sobre o desenvolvimento não inclui reversões de posições anteriores."

Não obstante, a mudança introduzida pelo Papa Francisco no Catecismo da Igreja Católica relativamente à pena capital foi precisamente o exemplo que deu na sua palestra aos jesuítas portugueses para endossar a sua afirmação de que “a visão da doutrina da Igreja como monolítica é errada”. Em Lisboa, foi mais longe do que declarações anteriores, afirmando que “a pena de morte é um pecado. Você não pode empregá-lo, mas não era assim antes.”

Para desmantelar a falsa alternativa apresentada pelo Papa Francisco, nomeadamente, a de ter de escolher entre a doutrina e a moral evolucionárias ou uma ideologia rígida, ajuda recordar a diferença abismal entre a missão pastoral tradicional da Igreja e a nova missão pastoral do Papa argentino. Como explica Guido Vignelli, no seu sentido tradicional,

"a teologia pastoral é uma ciência prática que estuda como ajustar a vida humana às exigências da Verdade revelada, cumprindo os seus princípios dogmáticos, morais e litúrgicos. Não aborda o objetivo, mas apenas o caminho para alcançá-lo, anunciando e transmitindo eficazmente o Evangelho à humanidade de uma forma que corresponda às oportunidades do tempo e do lugar.

A política pastoral, portanto, depende do dogma, da moralidade e da liturgia; isto . . . não pode mudar dogmas, lei e adoração. . . .

Assim, [a] nova política pastoral. . . é entendida não como a arte de converter os homens a Deus. . . mas como pedagogia do diálogo e do encontro entre iguais entre a Igreja e a humanidade na sua situação histórica e social concreta. . . .

No final deste processo, ocorre uma inversão: em vez de adaptar a vida à verdade, a verdade adapta-se à vida e, portanto, a política pastoral já não é um caminho, mas um fim, não um meio, mas um fim. . . .

Ao assumir que a vida tem precedência sobre a verdade, o caminho sobre a meta e os meios sobre o fim, a teologia moderna acaba por consagrar a primazia da política pastoral sobre a doutrina. . ..

. . . O comportamento torna-se critério absoluto e lei suprema não só da vida, mas também da doutrina e do ensinamento da Igreja, substituindo a sua função magisterial pela pastoral.

No final do processo, “a única verdadeira ortodoxia é. . . ortopraxia”, como denunciou um futuro papa em sua época (Joseph Cardinal Ratzinger com Vittorio Messori, The Ratzinger Report: An Exclusive Interview on the State of the Church, trad. Salvator Attanasio e Graham Harrison (San Francisco: Ignatius Press, 1985), 185).

Fundado como está numa teologia pastoral nova e errada, o ataque do Papa Francisco aos católicos americanos pelo seu apego à compreensão tradicional da Fé e ao seu ministério pastoral foi totalmente equivocado.

Além disso, os fundamentos filosóficos e teológicos para esta acusação equivocada revelam uma compreensão imanentista, relativista e populista da cultura e da fé, semelhante à da “Teologia do Povo”, juntamente com uma visão modernista do desenvolvimento evolutivo de dogmas e morais há muito tempo. condenado em Pascendi Dominici gregis.