sexta-feira, 10 de novembro de 2017

Catalunha (Parte 5) : O Projeto Político Independentista


Acima temos a foto da Boixos Nois, torcida organizada do Barcelona, que mistura socialismo e o nazismo em ódio aos judeus e a Madrid. Um exemplo de que fascismo e socialismo andam juntos.

Fuentecalada fala até do Boixos Nois em seu último texto sobre a Catalunha que pedi para ele produzir para o blog. Esse é o último texto de Fuentecalada sobre o assunto.

Seguramente, com os textos dele, o blog consegue apresentar excelente chance para entender a Catalunha desde a sua formação histórica até os atos de Puigdemont. Esse nível de informação sobre o assunto não é encontrado em jornais.

Para ler a primeira parte, clique aqui, a segunda parte, aqui, a terceira, aqui e a quarta, aqui.

Vejamos o último texto de Fuentecalada abaixo:


Catalunha: um “procés” independentista de mais de quarenta anos”.
Autor: Fuentecalada

A nova Constituição dividiu administrativamente o país em “comunidades autônomas”, sendo a Catalunha apenas mais uma delas. Na região, foram restabelecidas a “Generalitat”, poder executivo local, e o “Parlament”, correspondendo ao legislativo.
O primeiro presidente da “Generalitat” sob o novo regime constitucional foi o nacionalista catalão Jordi Pujol, eleito de forma indireta em 1980. Pujol seria reeleito sucessivamente até 2003, sempre de forma indireta pelo “Parlament”. Pujol liderava a coalizão de partidos “Convergència i Unió” (CiU) e durante esse período manteve-se em apoio a todos os governos em Madrid, fossem “populares” ou “socialistas”. 
Desde 1984, pelo menos, Jordi Pujol e seus filhos começaram a ser citados como envolvidos em escândalos de corrupção. Em janeiro de 2013, Jordi Pujol, em uma entrevista na TV, negou ter contas na Suíça. Dois meses depois, seu filho Oriol seria condenado pelo Tribunal Superior de Justicia de Cataluña pelo delito de tráfico de influência. No ano seguinte, outro filho, Oleguer, passou a ser investigado por lavagem de dinheiro. Em seguida, Jordi Pujol enviou um comunicado à Imprensa em que admitia haver omitido ao órgão fiscal fazendário que mantinha dinheiro depositado em Andorra. Jordi Pujol foi denunciado por crimes de suborno, tráfico de influência, delito fiscal, lavagem de dinheiro, prevaricação, malversação e perjúrio.

Em maio de 2017, as investigações policiais concluíram que a família Pujol auferira “benefícios não justificados” de suas contas em Andorra, desde 1990, configurando-se em organização criminosa liderada pelo filho primogênito, Jordi Pujol Ferrusola que, desde então, encontra-se preso sem direito a fiança, pois tentou evadir do país mais 29,91 milhões de euros quando estavam em curso as investigações.


Jordi Pujol interessado em Jordi Pujol.
Em 2003, o “Partido de los Socialistas de Cataluña” (Partit dels Socialistes de Catalunya, abreviado PSC), a representação regional do PSOE, elegeu Pasqual Maragall o novo “President”, após firmar um pacto com a ERC  (Esquerra Republicana de Catalunya) e o partido eco-socialista “Iniciativa per Catalunya Verds” (ICV-EUiA). Apesar das crises internas na coalizão, com a expulsão de seis conselheiros da ERC do governo, os acordos seriam recompostos em 2006, o que garantiu a continuidade do PSC no poder, apesar de haverem recebido menos votos. Foi eleito José Montilla, o primeiro não catalão a assumir a presidência da “Generalitat”, apesar do desgaste que havia sofrido por seu envolvimento em um nebuloso caso que envolvia a disputa pela maior empresa de energia espanhola, a Endesa e a doação de 6,3 milhões de euros para o PSC, que reagiu afirmando que outros partidos também haviam feito operações semelhantes. Em 2007, Pasqual Maragall, já acometido do Mal de Alzheimer, declarou no rádio que havia abandonado o PSOE e que havia cometido um erro ao confiar em Luís Zapatero, o socialista que presidiu o governo espanhol de 2004 a 2011. Maragall queixava-se da relutância com que as lideranças o PSOE receberam sua iniciativa de aprovar um novo Estatuto para a Catalunha, em que estivessem contempladas questões como a imigração, a presença da “Generalitat” na União Européia e a inclusão de uma “carta de direitos sociais”. A proposta do novo “Estatut” gerou os debates e crises políticas usuais. Levado a consulta popular, foi aprovado por 1.899.897 votantes, em um eleitorado de 5.310.103. O índice de abstenção foi de 51,15%.
Nos anos seguintes, com a previsão legal incluída no novo “Estatut”, a “Generalitat” abriu “embaixadas” no exterior, uma inclusive em Madrid, além de criar uma nova estrutura burocrática, o Diplocat – “Consell de Diplomàcia Pública de Catalunya”, o que ampliou as possibilidades de nomeações políticas para os novos cargos criados e contribuiu para aumentar o já crônico déficit orçamentário.
O governo socialista de Zapatero conseguiria aprovar, em março de 2010, uma nova lei do aborto, sob o pretexto de “garantir os direitos fundamentais no âmbito da saúde sexual e reprodutiva estabelecidos pela Organização Mundial de Saúde (OMS)”. A nova lei, na prática, se constituiu na permissão da prática do aborto sem necessidade de ser apresentada qualquer “justificativa”. Pasqual Maragall não se opunha à liberação do aborto, havendo admitido, em 2003, que as poucas restrições da lei então vigente já vinham sendo burladas, pois, segundo afirmou, “a realidade social se adiantou em relação à lei”.
A CiU voltaria ao poder em 2010, assumindo a presidência da “Generalitat” o político Artur Mas, que se apresentou como business friendly, mas logo se converteria em um fervoroso independentista catalão. Artur Mas seria reconduzido sucessivamente até 2016, sempre de forma indireta, apesar de seu nome aparecer envolvido em denúncias de corrupção, o chamado caso dos 3%, percentual da propina que seu partido cobraria nos contratos públicos, caso que ainda se encontra sob investigação.
Em 2012, em meio a queixas recorrentes por mais recursos do governo central para financiar o crescente déficit do governo catalão, Artur Mas antecipa a convocação de eleições na Catalunha. Apesar de haver perdido cadeiras, seu partido consegue reconduzi-lo à presidência com o apoio da ERC. Sem resolver a questão do déficit cada vez maior, Artur Mas, apesar de por duas vezes impugnado judicialmente em sua pretensão de realizar um referendo, convoca para 2014 um “processo participativo” para consultar a população sobre a independência. O resultado favorável de 80,76% dos votantes não permitiu esconder o fato de que o “processo” era de pouco interesse para a maioria dos catalães, pois apenas 37% do eleitorado compareceu às urnas. Para as eleições que se realizariam em 2015, Artur Mas propôs a formação de ampla coalizão de partidos e de “integrantes da sociedade civil”, favoráveis à independência, sob o nome de “Junts pel Sí” (Juntos pelo Sim), pretendendo torná-la uma consulta plebiscitária. Apesar de ser a lista mais votada, a “Junts pel Sí” não obteve a maioria. Tiveram início negociações com a agremiação “anti-sistema” de extrema-esquerda “Candidatura d’Unitat Popular” (CUP), cuja denominação é assumidamente inspirada na “experiência” da “Unidad Popular” de Salvador Allende no Chile. A CUP, porém, condicionou seu apoio à retirada de Artur Mas, que foi substituído por Carles Puigdemont como presidente “Generalitat”. No dia seguinte, Artur Mas renunciou à sua cadeira de deputado e deu início à fundação de um novo partido, o “Partit Demòcrata Europeu Català” (PDeCAT), que se apresenta como “democrata, catalanista, independentista, europeísta e humanista” e “republicano”, em que também ingressou Carles Puigdemont.
Em 13 de março de 2017, Artur Mas foi condenado pelo “Tribunal Superior de Justicia de Cataluña” (TSJC) a dois anos de inabilitação para exercício de cargo ou emprego público e pagamento de multa de 36.500 euros, além das custas processuais, pela prática de crime de desobediência, por haver sido o responsável pela realização ilegal do “processo participativo” com uso irregular de recursos públicos. Em conseqüência, também foi sentenciado pelo “Tribunal de Cuentas”, junto com outras autoridades de seu governo, a ressarcir ao erário o dano causado, no montante de 5 milhões de euros. Em sua defesa, Artur Mas alegou que foram “voluntários” quem haviam realizado o “processo participativo” e anunciou sua intenção de recorrer da sentença ao “Tribunal Europeo de Derechos Humanos de Estrasburgo”. Ainda assim, com o auxílio de duas ONGs que se apresentam como “entidades culturais” dedicadas à “causa independentista”, a “Asamblea Nacional Catalana” (ANC) e “Òmnium Cultural”, que criaram uma “caixa de resistência”, os condenados conseguiram, até agora, restituir 2,2 milhões de euros. Ambas as entidades são subvencionadas pela “Generalitat” e seus dirigentes, Jordi Sánchez e Jordi Cuixart, respectivamente, estão cumprindo prisão preventiva pela participação nos recentes atos de sedição e ataques à Guarda Civil, ocorridos em vinte de setembro.
Carles Puigdemont ingressou cedo na política, sendo um dos fundadores, em 1981, da “Joventut Nacionalista de Catalunya”, entidade ligada ao pujolismo, movimento de caráter populista liderado pelo então presidente da “Generalitat” Jordi Pujol. Em 1999, depois de realizar uma “viagem de estudos” pela Europa, foi encarregado pela “Generalitat”, ainda sob o comando de Jordi Pujol, de criar mais um aparato burocrático, a “Agència Catalana de Notícies” (ACN), a qual iria dirigir até 2002. Com a derrota eleitoral da CiU, o partido ofereceu a Puigdemont um cargo de diretor na “Casa de Cultura de Girona”. Assumiria depois a direção da revista mensal “Catalonia Today”, publicação em inglês vinculada ao jornal “El Punt Avui”, baseado em Girona, que recebe subsídios do governo catalão, além de ser um dos maiores destinatários das verbas de publicidade da “Generalitat”.
Puigdemont começou sua vida profissional como revisor ortográfico no “El Punt Avui”. O “Catalonia Today” atualmente é editado pela mulher de Puigdemont, a romena Marcela Topor. Puigdemont é membro do “Col·legi de Periodistes de Catalunya” (CPC), entidade associativa de jornalistas, criada por lei pelo “Parlament” catalão, que se dedica a criar e coordenar a ação de “grupos de trabalho que se reúnem periodicamente para manter uma ação contínua sobre diferentes aspectos da profissão jornalística”, o que lhe garante amplo e indefinido campo de atuação.
Em 2001, Puigdemont foi eleito alcaide de Girona, função política assemelhada a de prefeito municipal. Em 2006, Puigdemont elegeu-se deputado, o que garantiu a continuidade do fluxo de verbas da “Generalitat” para o “Catalonia Today” e, ao menos um aporte inicial para o projeto “Doble Utopia”, empresa de comunicação criada por Puigdemont juntamente com Saül Gordillo, o diretor da rádio estatal da “Generalitat”, a “Catalunya Ràdio”, detentora de quatro emissoras. O projeto “Doble Utopia” resultou no surgimento da “Catosfera”, que se dedica a promover “um ciclo de discussões aprofundadas e conversas inspiradoras sobre desenvolvimentos tecnológicos e o mundo da Internet”. Além da emissora de rádio, a “Generalitat” também possui uma emissora de TV, a “Televisió 3” ou, simplesmente, “TV-3”, mais um empreendimento estatal a cargo da “Corporació Catalana de Mitjans Audiovisuals”, o ente público que gerencia os meios de comunicação controlados pela “Generalitat”, dentre os quais a “Agència Catalana de Notícies” (ACN), sugerida, criada e inicialmente dirigida por Puigdemont. Com 60 empregados, a folha de pagamento da ACN supera a dois milhões de euros anuais e a empresa acumula prejuízos na ordem de oito milhões de euros.
Contudo, os prejuízos não se restringem à ACN. O custo anual da “Corporació Catalana de Mitjans Audiovisuals” (CCMA) para as arcas da “Generalitat” é de 240 milhões de euros anuais, transferidos por meio de subvenção direta e pela “contratação de serviços”, além de a CCMA receber recursos da Comunidade Européia. Ao final de 2016, a estatal registrava prejuízos acumulados de 779 milhões de euros.
Recentemente, a “Generalitat” criou o CESICAT, um “Centro de Segurança da Informação da Catalunha”, cujo propósito declarado é “garantir a proteção, prevenção e governança em matéria de cibersegurança da Generalitat e do Govern”. Investigação levada a cabo pela “Fiscalía de la Audiencia Nacional”, órgão assemelhado ao Ministério Público, porém, aponta que o organismo executa atividades irregulares como a censura de páginas web e o controle de comunicações, interceptando mensagens de correio eletrônico e telefones móveis, além de acessar bases de dados ilegalmente.
Entretanto, a proliferação de agências e entes estatais criadas pela “Generalitat” não se limita aos meios de comunicação. Levantamento mais recente em que, além da Administração central da “região”, foram incluídos os entes gerados pelas quatro “deputaciones” (câmaras locais de deputados, equivalentes a vereadores municipais) e os 947 “Ayuntamientos” (executivo municipal) da Catalunha, indicou que orbitam em torno do erário 1.309 entidades, incluindo variados tipos de fundações, “entidades sociais”, empresas e órgãos públicos como a “Agència Catalana de l’Aigua” (ACA) e o “Institut Català del Sòl” (INCASOL), o “Consell Català de la Producció Agraria Ecològica” (CCPAE), a “Agència Catalana de la Joventut” ao lado do “Consell Nacional de la Joventut de Catalunya”, a “Autoritat Catalana de la Competència” (a denominação é impagável), e por aí vai... todas com altaneiros propósitos beneméritos ou de valorização da cidadania, cueste lo que cueste... Como bem sabemos aqui no Brasil: É preciso amar as pessoas como se não houvesse amanhã...
Com tanto a fazer, ninguém irá trabalhar de graça. Os salários médios dos “executivos de máxima responsabilidade” vinculados à “Generalitat” andam na média dos 70 mil euros anuais. Nada mal, ainda que menores, na média, do que o salário pago à secretária que ocupa o cargo de “Responsável pelo escritório do ex-presidente Artur Mas”: pouco mais de 99 mil euros por ano. Melhor é o salário anual de Puigdemont: 139.585 euros. Mas, ora, afinal ele é o “President”. Ou era, até o governo espanhol, relutantemente é verdade, intervir na Catalunha e provocar apreensão dentre tantos abnegados que, convictamente não cansam de repetir: “España nos roba”...
Em 2015 Puigdemont reelegeu-se deputado na lista do “Junts pel Sí”. Chegou à presidência da “Generalitat” em 2016, com o decisivo apoio da CUP e tendo como vice Oriol Junqueras da ERC. Sim, a mesma ERC que anteriormente se coligara com os socialistas do PSC no governo da “Generalitat”, quando conseguiram triplicar a dívida pública, agora passou a governar com a “centro-direita”(?!) catalã, também pródiga em aumentar dívidas e impostos.  Todos independentistas.
Oriol Junqueras, formado em História, defendeu em artigo publicado em 2008 no “El Punt Avui” que os catalães formam um “grupo genético” distinto dos espanhóis. Junqueras mantém boas relações com o “Partit Socialista d’Alliberament Nacional dels Països Catalans” (PSAN), um agrupamento marxista-catalão (?) radical que se considera o fundador do independentismo, mantém aliança com o ETA e exerce considerável influência na direção da “Asamblea Nacional Catalana” (ANC).
Junqueras também cultiva amizades com a turma do “Boixos Nois”, uma torcida organizada do clube de futebol Barcelona, composta por ultranacionalistas catalães que se dedica a atividades lúdicas como entoar gritos de “Fucking Jew” e desfraldar a bandeira senyera adornada com uma suástica. Nos momentos mais compenetrados, os Boixos Nois” estão envolvidos em pancadarias, assaltos de ocasião, disputas com rivais traficantes de drogas e atos de hostilidade contra migrantes de outras regiões da Espanha que chegam à Catalunha à procura de trabalho.


Junqueras é alguém que quer ser levado a sério.
Nascidos e criados em uma região marcadamente católica, Junqueras e Puigdemont também se declaram “católicos”, ainda que a seu modo, especialmente quando há celebrações importantes em que a quantidade de pessoas reunidas pode render frutos eleitorais. Junqueras, filiado à historicamente anticlerical ERC, admitiu que vai pouco à missa e ainda menos ao confessionário. Puigdemont, mais do que católico, antes se considera alguém vinculado “aos princípios básicos do cristianismo”. Nas ocasiões especiais, ambos entram na fila para receber a comunhão. Na mão.

Apesar dos atos de piedade religiosa, Puigdemont deve sua chegada ao cargo de “President” ao apoio da extremista CUP. Em maio deste ano, a CUP apresentou uma queixa ao Governo contra o Bispo de Solsona, Xavier Novell, por considerar que este, durante a homília dominical, fizera “declarações homofóbicas” ao apontar a ausência da figura paterna como possível causa do “crescente fenômeno de confusão na orientação sexual de jovens adolescentes”. A queixa foi apresentada em nome da “liberdade religiosa” e a CUP não deixou passar a oportunidade para, como faz usualmente com todo aquele de quem não gosta, qualificar o bispo de “fascista”.
A CUP não restringe a “luta política” aos limites da atividade parlamentar ou na publicação de notas e queixas. Dispõe também de alternativas para a chamada “ação direta”. Por ocasião das recentes agitações de rua e na expectativa de haver uma “declaração unilateral de independência” da Catalunha, a CUP distribuiu entre seus militantes um manual de guerrilha urbana com instruções para o “enfrentamento” dos agentes de polícia, a quem chama de “gentuza” (gentinha). Os ataques violentos resultaram em dezenas de policiais feridos durante as “jornadas” da “revolução dos sorrisos”, especialmente pela atuação dos grupos de jovens militantes anti-sistema que se identificam como Arran e usualmente utilizam a “tática black-block”.


Membros do Arran ocupam a sede do Partido Popular em Barcelona.
Março/2017 – El Confidencial.
Em meio às arruaças e antes mesmo de Puigdemont comicamente haver declarado a “independência”, para requerer em seguida que fosse suspensa, a CUP já divulgava planos de “ocupação do território”, que incluíam o controle de portos e aeroportos e o “controle de capitais”, na forma de um bloqueio de contas correntes ao estilo “corralito”, o que acelerou a corrida bancária e a fuga de empresas da região. Porém, a CUP exige mais. Definindo-se como uma “organização política assembleísta, de caráter socialista e abrangência nacional”, a CUP pretende substituir o “modelo sócio-econômico capitalista” por um novo modelo, vagamente indicado como sendo o resultado da “libertação nacional e social dos países catalães”, em que se defende os serviços públicos, o “controle popular da economia”, a ecologia e a “luta feminista e a liberação sexual e de gênero”. Apesar do caráter nacionalista que envolve a pretendida “independência dos países catalães”, que serão no futuro, segundo a CUP, “territorialmente equilibrados e desligados das formas de dominação patriarcal”, os cupistas não abandonam o velho discurso de internacionalismo, “como forma de relação igualitária, anti-colonial e fraternal entre os povos e a superação dos conflitos internacionais”. Espanha, claro, não conta, pois, também para a CUP, “España nos roba”...
Há ainda, a coalizão esquerdista “Barcelona em Comú”, na qual confluem a “Iniciativa per Catalunya Verds”, ex-aliada da ERC, a “Esquerra Unida i Alternativa”, o “Equo” (ecologistas), “Procés Constituent” e “Podemos”. A “Barcelona em Comú”, em 2015, elegeu Ada Colau, festejada como “a primeira mulher a ser eleita alcadesa de Barcelona”. Apesar de apoiarem o processo separatista e serem contrários à monarquia, não integram diretamente a coalizão que, até a intervenção decretada por Mariano Rajoy, governava a “Generalitat”. “Podemos”, em particular, enfrenta dificuldades para manter seus ganhos políticos dos últimos anos pois, além de ver o surgimento de potenciais competidores que poderão abocanhar fatias do eleitorado com o mesmo discurso anti-sistema que deu projeção ao partido de Pablo Iglesias, enfrenta o dilema de ter que conciliar uma posição em favor do “direito de decidir” com o crescente, e de certa forma inesperado, sentimento patriótico da população espanhola que, majoritariamente, rejeita os movimentos separatistas. Iglesias sofreu forte desgaste quando postou no Twitter, em 2/11/2017, que “sentia vergonha” de que na Espanha opositores políticos fossem encarcerados, referindo-se às recentes prisões de Oriol Junqueras e outros membros da “Generalitat”, e pediu a libertação dos “presos políticos”, apesar de haver ressaltado que “não queremos a independência da Catalunha”. Imediatamente recebeu uma enxurrada de mensagens apontando sua hipocrisia, pois anteriormente havia justificado a detenção de Leopoldo López, aprisionado pela ditadura de Nicolás Maduro, sob o argumento de que era preciso “respeitar a legalidade”.
Pouco antes de abdicar em favor de seu filho, o rei Juan Carlos I concordou em participar de um documentário produzido pela televisão francesa. No vídeo, o rei confidencia que, estando Franco em seu leito de morte, um dia antes de morrer, chamou-lhe e segurando-lhe a mão disse: “Alteza, a única coisa que lhe peço é que preserve a unidade da Espanha”. E prosseguiu o Rei, pensativo: “Ele não me pediu faça isso ou aquilo outro. A unidade da Espanha. Se pensas bem, isso quer dizer muitas coisas. A unidade da Espanha. Isso é tudo”.
Considerado o principal fiador da “transição” que resultou no atual arranjo constitucional, Juan Carlos não é mais o rei. A intervenção na Catalunha, efetuada de forma relutante pelo governo de Mariano Rajoy, com base no artigo 155 da Constituição, obteve o apoio do PSOE com uma condição: dar início a um processo de reforma da Constituição. O que virá dessa reforma é ainda uma grande incógnita. Porém, a história nos dá algumas pistas. Em 1974, ainda na clandestinidade, o PSOE realizou um Congresso em Suresnes, França, no qual aprovou diversas resoluções. Uma delas, que diz respeito a “Nacionalidades e Regiões” afirma que o PSOE se pronuncia “pela constituição de uma República Federal”, velha tese postulada desde a fundação do partido, em 1879, sob a liderança de um tipógrafo chamado Pablo Iglesias.


Um comentário:

Isac disse...

Dividir para dominar, como isso funciona na lei atual de fomentar as infernais lutas de classes, o povo x povo!